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Músicas e paródias nas campanhas políticas
Publicado em 15/08/2018

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Início do período eleitoral suscita questões sobre o uso correto - e o indevido - de composições por candidatos. Entenda como o direito moral é fundamental nesse processo

Do Rio

Em tempos de campanha — e profunda polarização — política, autores e compositores devem ter redobrado cuidado com o uso de suas obras pelos candidatos. Afinal, autorizar a incorporação de uma canção ao horário eleitoral da TV ou aos comícios de um político pode ser visto com uma chancela a suas ideias ou práticas. (O que não necessariamente é positivo num momento de particular desilusão dos eleitores/fãs com o panorama político nacional.)

Quando uma campanha pede autorização para fazer uso de uma canção, o primeiro passo é contatar o titular dos direitos autorais patrimoniais. É muito frequente que um artista ceda tais direitos a uma editora, que passa a administrar os usos do repertório em troca de um percentual sobre os ganhos. Então, é quase certo que quem autorizará o uso será essa editora. Contudo, existe uma “bala de prata” que a lei internacional, e também a brasileira, assegura para sempre ao autor, justamente para evitar os usos de sua obra que ele considere danosos a sua reputação ou honra: o direito moral.

“Está no artigo 24, incisos 4 e 6, da lei 9.610/98. O direito moral garante ao autor assegurar a integridade da obra, opondo-se a modificações ou à prática e aos atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-lo ou atingi-lo em sua reputação ou honra. O autor pode até tirar a obra de circulação ou suspender a autorização de uso, mesmo que ela tenha sido dada pela editora”, explica Flavio Pougy, do escritório carioca Pougy Tupinambá Advogados, especializado em direitos autorais. “Agora, se a editora discordar da intervenção do autor, ela pode mover ação contra o autor para reaver eventual prejuízo financeiro. Caberá ao juiz determinar se a editora se excedeu ao licenciar a música para uma campanha política, por exemplo.”

Por isso, Pougy afirma ser importante mencionar as campanhas políticas nos contratos celebrados com as editoras, deixando previstos, assim, por escrito, os limites e termos para tais usos de uma obra.

Isso é mais óbvio numa propaganda de TV ou rádio, por exemplo. Mas nem tanto num comício ou num evento político de outra natureza, quando se pode alegar que a música era tão-somente uma inocente "trilha de fundo". Foi o que ocorreu em agosto do ano passado, durante um evento de inauguração pelo então prefeito de São Paulo João Doria, atual candidato ao governo do Estado de São Paulo. Sem pedir autorização, a produção do evento usou e registrou em vídeo uma canção (“Ainda Bem”) dos Tribalistas, gerando mal-estar entre seus autores.

Na época, Marisa Monte e Arnaldo Antunes pediram a remoção do vídeo das redes sociais onde ele havia sido publicado pela equipe de Doria. Segundo Marisa, o ex-prefeito tardou mais de dois meses em dar uma resposta, alegando que a música havia sido captada de forma espontânea no ambiente das gravações. A equipe do atual candidato também afirmou ter pago os direitos autorais de execução pública. A explicação não foi suficiente para os autores, que lançaram mão do direito moral para não ter uma obra sua associada a ele. Marisa e Arnaldo moveram ação contra Doria na qual pedem indenização de R$ 220 mil e o cessamento da utilização. O caso tramita na Justiça. 

Anos antes, outro caso de uso indevido foi parar nos tribunais e terminou com a condenação de um político. Na sua campanha de 2014 para a Câmara dos Deputados, Tiririca (PR-SP) fez uma “paródia” da canção “O Portão”, de Erasmo e Roberto Carlos. No lugar de “Eu voltei, agora pra ficar... Porque aqui, aqui é o meu lugar”, Tiririca cantava “Eu votei, de novo vou votar... Tiririca, Brasília é seu lugar”. Sem autorização dos autores, a alegação de que se tratava de uma paródia — o que, em teoria, poderia lhe garantir o uso livre — não prosperou. Em julho de 2017, o Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou, na segunda instância, decisão anterior que obrigava Tiririca a pagar indenização de 20 vezes o valor que originalmente custaria o licenciamento, cuja cifra não foi divulgada. 

“É uma paródia. O fato de ser uma propaganda eleitoral não muda isso”, alegou Roberto Vita Porto, defensor do deputado. 

Não é bem assim. “A paródia não se presta a campanha política. A paródia tem objetivo de fazer piada, não de vender algo, como pode ser o caso de um candidato que se vende politicamente”, afirma Pougy. “No mundo político, não cabe essa alegação, sendo necessárias as autorizações dos titulares dos direitos patrimoniais e também morais antes da utilização de uma criação baseada em outra obra”, ele encerra.

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