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Já 'viu' essa música?
Publicado em 15/07/2019

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Na era da imagem, e com a ajuda dos avanços tecnológicos e plataformas de reprodução, produção de videoclipes se multiplica exponencialmente, a ponto de alguns álbuns já saírem inteiramente com sua versão audiovisual
 
Por Kamille Viola, do Rio
Foto da cantora Clarice Falcão por Pedro Pinho
 
Os álbuns visuais ou audiovisuais são uma tendência em crescimento no país. Em abril, Anitta lançou “Kisses”, com dez canções e seus respectivos vídeos. Mês passado, foi a vez de Wesley Safadão soltar “TBT”, álbum audiovisual gravado em Fortaleza com o cantor interpretando 19 sucessos do tempo de sua ex-banda, Garota Safada. Tiago Iorc ressurgiu depois de um hiato com “Reconstrução”, com 13 músicas e seus respectivos videoclipes. No ano passado, Marcelo D2 lançou “Amar é Para os Fortes”, álbum e filme, estrelado por seu filho Stephan. Xenia França também prepara um no formato. 
 
O aumento do número de artistas que apostam nesse tipo de trabalho não é por acaso: o YouTube é o meio mais usado para se ouvir música no Brasil, de acordo com a edição de 2018 da pesquisa Video Viewers, realizada pelo Google em parceria com o Instituto Provokers e com a Box 1824. Não que a plataforma do conglomerado Google tenha inventado a roda. “A Hard Day’s Night”, dos Beatles, considerado o primeiro álbum visual de grande sucesso da história, foi lançado no digitalmente pré-histórico ano de 1964. Mas, na era do streaming e da internet acessada via smartphones, o casamento entre música em imagem ganha outro sentido.
 
Para a jornalista Leïlah Accioly, pesquisadora da história do videoclipe, existe um consumo de informação como nunca houve no Brasil, e isso também muda no público a relação com a imagem. A ponto de adolescentes e crianças, por exemplo, já dizerem aos colegas, ao perguntar sobre uma novidade: “já viu essa música?”
 
 
A pulverização da difusão dos clipes paradoxalmente tem a ver com a saída de cena de um forte mediador — no caso, a MTV. O formato passou a permear muito mais o cotidiano do que antes. 
"Tudo está apegado à parte imagética. A música faz parte da humanidade, ela é uma entidade viva que dialoga com seu tempo, então acabou absorvendo essa faceta."
Jeza da Pedra, rapper
 
“A MTV é uma marca muito forte, com uma estética muito própria e muito definida. E, na internet, você tem um fluxo livre, mais hipertextual, mais solto, mais fluido da imagem. Isso favorece, pensando no Kondzilla, por exemplo, que artistas periféricos tenham muito mais acesso a produzir do que antes. O volume que ele alcançou de visualizações (é enorme)”, ela pondera, destacando os implementos tecnológicos que facilitaram a produção: “muito equipamento mais barato, o advento do celular, câmeras digitais cada vez mais portáteis, menores, e filtros e pós-produção (simplificada). Num Maczinho você já consegue produzir alguma coisa. A galera já começou a poder botar as suas ideias para fora e a fazer o videoclipe circular com mais força.”
 
A cantora Clarice Falcão, que em junho lançou o disco “Tem Conserto”, o terceiro de sua carreira, foi soltando aos poucos as faixas do trabalho em formato de clipes. “Minha Cabeça” saiu em abril. “Mal Pra Saúde” veio em maio. Em junho foi a vez de “Esvaziou”, poucos dias antes do álbum. Ela conta que sente que seu público tem necessidade de vídeos. “No meu segundo disco, algumas músicas grandes não tiveram clipes. E é sério: me xingam até hoje por isso: ‘Ai, cadê o clipe de ‘Vagabunda’, nunca teve, sua enrolona!’”, diverte-se ela.
 
VEJA MAIS: O clipe de “Esvaziou”, de Clarice Falcão
Clarice tem uma história antiga com o YouTube. Além de ter ficado famosa ao fazer parte do canal de humor Porta dos Fundos, no qual era roteirista e atriz, sua estreia na música também foi na plataforma: em 2007, a canção “Australia”, composta e interpretada por ela, fez parte da trilha do curta “Laços” (em que também atuou), que recebeu o prêmio Project: Direct, competição realizada pela plataforma. “Inclusive o primeiro lugar em que eu coloquei as minhas músicas foi o YouTube. Não era exatamente um clipe, era eu tocando violão meio ao vivo, o que seria hoje em dia um vlog, sei lá, acho que naquela época estava muito popularizada essa palavra. Tenho uma relação realmente muito próxima com ele”, diz ela, referindo-se a vídeos como o de “Fred Astaire”, o primeiro postado por ela em seu canal, em janeiro de 2012.
 
O rapper Jeza da Pedra, que atualmente divulga seu projeto ao lado de Kassin (chamado simplesmente Jeza Kassin), planeja para o segundo semestre um EP com três clipes, “Átomo de Verão” (ele está com uma campanha de financiamento coletivo para o projeto), seu segundo trabalho solo. Para ele, o formato audiovisual é muito importante para quem faz música hoje. “Tanto gente da minha geração (ele tem 35 anos) como quem está na faixas dos 20 em geral procura as músicas primeiro no YouTube para só depois ir atrás do EP ou do álbum. É muito doido como essa coisa do audiovisual está presente. Isso tem a ver também com os aplicativos, como o Stories do Instagram, por exemplo. Tudo está apegado à parte imagética. A música faz parte da humanidade, ela é uma entidade viva que dialoga com seu tempo, então acabou absorvendo essa faceta”, define. “Por exemplo, a  Beyoncé fez esse documentário com o show dela naquele festival (“Homecoming”, sobre a participação da artista no Coachella de 2018), e a primeira coisa que fez botar na Netflix, uma plataforma que está popularíssima”, exemplifica.
 
VEJA MAIS: O clipe de “Terrorista Viado”, de Jeza da Pedra
Alçado ao sucesso quando a MTV ainda estava no auge, Lucas Silveira, da banda Fresno, viveu os tempos de grandes investimentos em clipes. Hoje, com a volta da importância do formato, ele acredita que é preciso se adaptar às novas linguagens. “Percebo que já passamos por um momento de infância do YouTube, que era tipo: ‘Põe o clipe lá e vê o que acontece.’ Mas ele ainda era produzido com aquela mesma cara de MTV. Ou seja, às vezes clipes que demoram muito para começar. Eu já fiz um com introdução de um minuto e meio: perdeu o view já ali! Então a mentalidade tem que ser diferente. A música tem que ser sempre pensada pelo suporte em que vai ser consumida”, defende. 
 
No último dia 5, o Fresno lançou seu oitavo álbum, “Sua Alegria Foi Cancelada”. Cada faixa ganhou um lyric video disponibilizado no canal do grupo, e eles foram estrelados pelos integrantes da banda e convidados como a youtuber Maju Trindade, a cantora Samira Close, grupo Dança do Leão & Dragão, e Keops e Raony, vocalistas do Medulla, entre outros. “Hoje eu sei que o nosso fã, e tem estatística para isso, ouve música no celular, vê o YouTube no celular. Então, a gente vê artistas que são mais focados no celular, já com o pensamento de vídeo vertical. Claro que tem um ou outro que mete YouTube na TV ou no seu computador em casa, mas eu estou pensando sempre em estar onde as pessoas estão. Tanto que a mídia do nosso disco novo é toda vertical. Vale a pena sacrificar os 25% de pessoas que veem um vídeo nosso em TV e em telas normais, porque eu sei que a maior parte da galera vai estar pelo celular”, argumenta o artista.
 
Lucas Silveira frisa que não basta ter uma grande sacada para fazer um videoclipe: é preciso que ela seja possível. “Ideia genial todo mundo tem. Se a gente sentar meia hora aqui, vai ter dez ideias boas para clipe. Agora, quantas factíveis? Por exemplo: eu quero fazer um vídeo em que eu estou andando e, de repente, estou voando. Você conhece um cara que faz voar? É importante ter essa realidade pautando sempre sobre como vamos fazer um clipe, para que a gente não se frustre”, analisa. “Hoje, o artista tem que ser multifacetado, tem que manjar de outras coisas. Você pode, inclusive, só ser um bom músico. Então, vai ser no máximo um exímio músico de estúdio, de acompanhamento. Mas um artista tem que ter um pensamento mais 360. Na minha visão, é trazer a música para o fã onde ele está no momento em que ele está. Tem que fazer com que as pessoas ouçam (seu trabalho) o máximo possível, então tem que estar em todos os lugares”, conclui.
 
VEJA MAIS: O clipe de “Sua Alegria Foi Cancelada”, de Fresno e Jade Baraldo

 

 



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