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Alta do dólar impacta fluxo de artistas entre Brasil e exterior
Publicado em 23/12/2019

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Tanto trazer gringos como mandar independentes daqui para tocar em Europa e Estados Unidos fica difícil com câmbio desfavorável; especialistas comentam e dão dicas para tentar contornar o problema

Por Alexandre Matias, de São Paulo

As oscilações — sobretudo para cima — do dólar nestes tempos de muitíssimas incertezas na economia e na área cultural brasileiras são uma péssima notícia para a indústria da música. Muitos são os impactos diretos, da compra de instrumentos e equipamentos de produção e edição lá fora, que fica obviamente mais salgada, às viagens em turnês independentes, geralmente com custos muito contados e, frequentemente, bancados pelo próprio cantor/cantora ou pela banda. Trazer gente de fora, então, dependendo do caso, é quase proibitivo, o que abala os tradicionais intercâmbios entre artistas estrangeiros e nacionais, fundamentais para a boa saúde do nosso cenário musical. 

"Eu trago artistas de fora para o Brasil, e a alta do dólar tem dificultado cada vez esse processo”, explica a pernambucana Ana Garcia, fundadora do festival No Ar Coquetel Molotov, que já se estabeleceu como um dos mais expressivos do país. “Na hora de pagar um artista gringo pequeno, que tem o cachê de US$ 8 mil — o equivalente a mais de R$ 32 mil pelo câmbio desta segunda-feira, 23 de dezembro —, e mais os custos de passagens, hospedagem, transporte, visto, fica difícil. São artistas em construção que não necessariamente conseguem vender ingressos. Em 2010, conseguimos trazer o Dinosaur Jr. pela primeira vez ao Brasil, com um cachê de US$ 25 mil. Mas, naquela época, o dólar estava a R$ 1,80 ou menos."

Fabricio Nobre, produtor dos festivais goianos Bananada, Vaca Amarela e Goiânia Noise, é outro que não está mais conseguindo contratar certos artistas. "Desde 2016, não consigo mais trazer americanos ou ingleses para o Bananada", reclama o também curador das casas do grupo Vegas (Cine Joia, Blue Note e Z, todas em São Paulo). "Neste último ano, o Cine Joia só comprou um show internacional com recurso próprio. Não dá... Alguns parceiros têm ótimas negociações com agências internacionais, e, juntos, conseguimos manter uma certa agenda de shows gringos. Mas um pouco menos que há três ou quatro anos."

Para os nossos, ir lá para fora também é duro com o dólar nas alturas. "Impacta principalmente quem está na fase inicial de internacionalização, que é uma fase de investimento”, detalha Ricardo Rodrigues, da agência Let’s Gig, responsável pelas carreiras de artistas como Liniker e os Caramellows e Luedji Luna. “Qualquer carreira internacional começa com investimento. E os custos, que costumam ser altos, ficam maiores ainda."

É que, sem produtores locais que apostem por seus nomes ainda em construção, muitos pequenos artistas precisam bancar parcialmente a primeira turnê. A alta recente dos preços das passagens aéreas, além do próprio dólar alto, não ajudam em nada nesse processo. "Eu já venho me preocupando com isso há alguns anos. Investimos bastante na internacionalização dos nossos principais artistas, tornando um pouco menor o custo para ir. Por mais que o custo da passagem aumente, ele não pesa tanto se você faz muita data. Mas isso funciona pra quem já tem público lá, o que é a realidade de pouquíssimos artistas no Brasil", continua Rodrigues.

Bruno Boulay, representante no Brasil da superfeira de música internacional Midem, também vê um cenário melhor para quem já se estabeleceu lá fora. "É uma oportunidade para promover shows de artistas brasileiros no exterior, pois os cachês deles ficam mais em conta para profissionais estrangeiros. Os empresários e produtores brasileiros deveriam aproveitar esta situação para oferecer seus artistas a agentes, casas de shows e festivais na Europa”. 

"A gente vai lá para fora e ganha na moeda lá de fora”, se consola Gabriel Thomaz, da banda Autoramas, que já estabeleceu um vínculo com a Europa, principalmente, onde toca todo ano. “Não tem proposta nenhuma do governo para o dólar baixar, então vamos ter que encarar isso.” Quanto à dificuldade para trazer gringos para cá, ele sugere que os produtores a contornem apostando mais em nomes nacionais: "É um momento oportuno para isso, uma solução caseira e de alta qualidade.”

Se o quadro não mudar, contudo, há quem veja uma debandada de artistas pequenos brasileiros em busca de se firmar em mercados estrangeiros. Se não tiverem como ficar saindo e voltando, alguns deles podem fazer as malas de vez, aposta André Bourgeois, da Urban Jungle, que administra as carreiras de Céu, Edgar, Teto Preto e Saskia. “É importante lembrar que não existem mecanismos institucionais de apoio para esse tipo de investimento no Brasil. Só artistas com uma base significativa de fãs vão poder excursionar. Todo mundo vai acabar se mudando para Lisboa, Paris, Berlim ou Nova York."

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Primeiros passos

Ricardo Rodrigues, sócio da agência Let's Gig - Booking and Music Services, dá três dicas para quem está querendo desbravar a carreira para além do território brasileiro, neste momento de dólar nas nuvens.

>> Antecedência

“Tudo lá fora funciona com antecedência, e isso ajuda a baratear qualquer turnê, desde passagens compradas que ficam bem mais em conta — inclusive as passagens internas — até o planejamento de uma rota que permita economizar com deslocamentos terrestres. Assim, você pode ter mais datas disponíveis quando estiver naquele deslocamento. Antecedência é a principal dica.”

>> Fora do verão

“Dependendo do ponto em que você está na sua carreira, a época de ir diz tudo. Por exemplo, se você for no verão, isso quer dizer que terá feito bons contatos para tocar em festivais. Se você quer tocar em casas de show, não vá no verão, várias casas de show inclusive fecham, porque é a época em que eles têm mais eventos abertos. O verão também é a temporada em que as passagens e os demais custos estão mais caros. Então, se você está começando, vá em outras estações fora da alta, terá maior chance de dar certo, porque o público não deixa de sair de casa por causa do frio. Quando se fala de Europa, Estados Unidos e Canadá, ir no inverno ou no começo da primavera ou do outono representa mais chance de conseguir datas."

>> América Latina

“A gente fica olhando muito para Europa, Canadá e Estados Unidos, mas, com certeza, o momento da América Latina é muito importante. Investir na América Latina é um grande negócio, em termos musicais, de mercados aquecidos... O custo é menor, tanto da viagem quanto da estada. A conexão entre os estilos musicais do Brasil e da América Latina está num momento muito em alta e só vai crescer.”

 


 

 



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