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Chico Lobo: boas palavras, boas sonoridades
Publicado em 14/10/2016

Violeiro mineiro lança novo álbum, com participações de Maria Bethânia e Renato Teixeira, em que celebra o encontro de culturas, o sincretismo e a tolerância

De Belo Horizonte
Foto de Ricardo Gomes

Minas é sincretismo, comunhão, “mutirão”. O encontro de povos, ideias e culturas na “esquina do Brasil” dá o tom do mais novo trabalho do violeiro Chico Lobo, “Viola de Mutirão – Do Sertão ao Mundo”, em que ele celebra parcerias com grandes nomes da nossa música, como Maria Bethânia, Renato Teixeira, João Araújo, Quinteto Violado e Paulinho Pedra Azul. A religiosidade, as festas populares e temas pessoais marcam as canções, que, como define Chico, são uma homenagem à população cabocla brasileira – e um chamado à tolerância e ao respeito à diversidade. Até a região de Mariana (MG), que sofreu um dos maiores desastres ambientais da história nacional, ano passado, ganhou uma canção, “Cantiga de Bem”.

Com mais de 20 álbuns de estúdio lançados, o compositor e instrumentista natural de São João Del-Rei (MG) e radicado em Belo Horizonte se apoia nas sonoridades da viola da mesma forma, explica, que uma árvore, “para poder se agigantar e experimentar novos rumos, precisa ter raízes firmes no solo – na tradição”. Confira o papo de Chico com o site da UBC.

Você já demonstrou em repetidas ocasiões, em mais de duas dezenas de álbuns, que tem grande versatilidade na hora de transformar em músicas e diferentes sonoridades as notas da sua viola. Ainda há algum tipo de som que não tenha explorado nela e que planeje explorar? Algum uso que ainda não tenha dado a esse versátil instrumento?

Chico Lobo: Para mim, sempre ficou claro que a viola, além de toda a carga de cultura inserida em seu bojo, é um instrumento muito generoso e versátil. Assim, sempre em meus trabalhos quis experimentar possibilidades na viola, mas sem perder o ponto de apoio que é a cultura de identidade inserida nela, como uma árvore, que para ser grande, forte e ver sua copa se agigantar e experimentar novos rumos, precisa ter raízes firmes no solo, no meu caso o solo da tradição. Penso que a viola e suas possibilidades não se esgotam, ainda quero fazer uma viola contemplativa, quase new age, para que as pessoas possam, através de seu som, mentalizar sentimentos bons. Ano passado tive uma rápida experiência com orquestra sinfônica. É algo que ainda quero fazer: uma releitura de minha obra com viola e orquestra sinfônica!

Como se concretizaram tantas parcerias diferentes na produção de “Violão de Mutirão - Do sertão ao mundo”? Como foi o processo de realização?

As parcerias, as presenças de tantos artistas maravilhosos, têm todas uma razão. Foi muito importante a presença do produtor musical do CD, Ricardo Gomes, que primeiro compreendeu que eu queria um som que partisse do regional e abrisse diálogo com a contemporaneidade, tanto em instrumentação quanto em estética musical. Também a mixagem e o máster de Ricardo Carvalheira foram fundamentais.

Parti de minha aldeia, Minas Gerais, convidando Paulinho Pedra Azul para cantar uma cantiga rural, “Tempo de Colher”. Aí, vem João Araújo que tem a pesquisa sobre viola urbana. Cantamos “Asa Branca”! Com Renato Teixeira, foi a necessidade de ressaltar meu amor ao Brasil, Renato marcou minha geração ao avançar a música caipira e conectá-la com a cidade grande sem perder raízes. Compus “Meu Chão” enquanto estava em Portugal, e ter Renato Teixeira foi tudo. O Quinteto Violado é um grupo muito importante na minha formação musical, desde a década de 70 acompanhei na juventude o movimento armorial do Nordeste e ouvi muito o Quinteto. Nos tornamos amigos, escrevi a letra “Acorde Brasileiro”. Marcelo Melo, do Quinteto, a musicou, e a parceria se complementou num arranjo lindo com a marca do Quinteto Violado e a minha viola.

Chegamos, então, à participação da Maria Bethânia, que também muito me honrou. Depois de nos conhecermos em 2015, quando ela escolheu minha música “Criação” para compor o repertório de seu show e DVD de 50 anos de carreira “Abraçar e Agradecer” , emocionado, compus a moda de viola “Maria” em homenagem a ela e guardei. Quando a convidei para o CD, enviei um batuque alegre, mas ela respondeu: “quero gravar com Chico Lobo, mas quero que ele me envie uma moda de viola”. Fiquei extremamente comovido, porque sei que Bethânia tem um olhar atento para o Brasil interior, rural. A música, então, teve a participação luxuosa do maestro Jaime Alem ao violão.

Esse conceito de mutirão parece interessante. De que maneira ele se concretizou na obra?

Mutirão é uma prática no interior do Brasil onde as comunidades se juntam para se ajudarem, sem interesse por nada em troca. São regados a sentimentos muito vivos de fé, amizade, amor, compadrismo, sentimentos de bem e de coletividade. O ponto de partida desse meu novo trabalho é essa prática do mutirão e todo o valor envolvido. Cantar e ressaltar esses sentimentos para que as pessoas possam, nesse momento tão individual, tão violento, reverem suas atitudes e relações. Assim, as letras ressaltam bons sentimentos.

Como avalia o panorama da música regionalista brasileira? 

Avalio com muita esperança, com muita alegria. Acho que estamos num momento crucial de rever valores, de olhar para nossa aldeia, de rever nossa identidade, e a música regionalista traz tudo isso com muita força. Quanto mais se canta a sua aldeia, mais universal se é! Tenho tido a chance de levar a minha viola a países como Canadá, Chile, Argentina, Colômbia, Portugal, Itália, China, e é sempre uma receptividade maravilhosa. Temos um mercado muito forte e potencial nos festivais de world music, nos festivais de musica étnica. São mais de 30 anos vivendo com a viola, 20 de mercado fonográfico, e vejo hoje o interesse de muitos jovens querendo rever sua identidade, querendo cantar a aldeia.



 


 

 



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