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Zé Manoel, ou como nascem os clássicos
Publicado em 03/01/2017

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Com apenas dois álbuns de estúdio, compositor pernambucano aclamado pela crítica já ganha 'songbook' recheado de participações de peso e crava seu nome entre os grandes da MPB

Por Bruno Albertim, do Recife
Foto de Gê Prado

José Manoel de Carvalho Neto é sertanejo de Petrolina, tem 35 anos e várias casas avançadas na trilha básica de um compositor brasileiro. A diferença é que as avançou bem rápido. Com apenas dois discos, recentes, no currículo, o pernambucano acaba de ganhar de presente – e esse termo nunca pareceu tão adequado – o inesperado songbook “Delírio de Um Romance a Céu Aberto”, idealizado e lançado pelos produtores Thiago Marques e Zé Pedro, da Joia Moderna. Desse repasso da sua obra participam nomes que contam a linha evolutiva da música popular brasileira, como Ná Ozzeti, Jussara Marçal, Elba Ramalho, Fafá de Belém, Ana Carolina e Vanessa da Mata.

“Eu fico, claro, muito feliz, pelo reconhecimento já tão cedo. Mais que um songbook, (o projeto) acabou se tornando um disco de carreira. Acabou virando meu terceiro disco”, diz Zé Manoel, responsável, ele próprio, pelos arranjos e pelo piano em todas as faixas do álbum. Apenas a última faixa vai além do diálogo das vozes com os teclados - a única, por sinal, inédita. Canção que dá nome ao projeto, “Delírio de Um Romance a Céu Aberto” é uma parceria entre o compositor e a mato-grosssense Vanessa da Mata.

“Vanessa fez a letra, e eu musiquei”, diz ele sobre a canção que os une mais do que pode parecer. “Como eu, ela vem do interior do Brasil e tem essa mesma experiência de ir crescendo diante de água doce”, conceitua Zé Manoel, aludindo à letra a respeito de uma pessoa nascida na beira do rio e que se descobre gente diante do espelho d`água. O disco virou realidade depois que, apresentado a ele pela amiga e cantora Ylana Queiroga, o produtor Thiago Martins levou ao DJ Zé Pedro  “Canção e Silêncio”, o segundo disco de Zé Manoel, lançado ainda em 2014, através do edital do Natura Musical. Os produtores foram de cara arrebatados pelas composições sutis e espessas, como as águas do Velho Chico, inspirador de grande parte da musicalidade do autor. A boa impressão foi tamanha que, pela primeira vez, o Joia Moderna resolveu homenagear um estreante.

“Quando eu me mudei pra São Paulo, este ano, o projeto acabou se viabilizando”, ele conta. No disco, Jussara Marçal faz de “Água Doce” uma oração ribeirinha. “Sol das Lavadeiras”, com Elba, noutro exemplo, é um baião desacelerado. “Volta Pra Casa”, com Ná Ozzeti, tem tempero praiano. Amelinha canta “Nós Que Nos Conhecemos Num Navio”, uma canção de amor imagética como um filme. Foi de Zé Manoel, não por acaso, o convite para a eterna intérprete de “Frevo-Mulher”: “Amelinha foi uma das primeiras compositoras que conheci. Um dos primeiros CDs que comprei foi 'Antônio Brasileiro', de Tom Jobim. O outro foi uma coletânea de Amelinha. Foi uma das primeiras cantora que conheci por conta própria. Gosto muito da voz dela.”

Já Ana Carolina vinha cantando, sem seus shows, a música que deu título ao, agora, cultuado segundo álbum de Zé Manoel. Naturalmente, “Canção e Silêncio” entrou com ela no projeto. “A ideia inicial era convidar apenas cantoras mulheres, mas, depois, resolvemos chamar também cantores”, ele diz. Assim, Alan Montarroyos interpreta a pujante “Deixa Partir”, uma parceria com Vinicius Sarmento.

Zé Manoel já andava desanimando, quando, por acaso, foi “salvo” pela crítica. Depois de uns meses trabalhando como cantor num navio de cruzeiros pela costa brasileira, aluno da faculdade de música da Universidade Federal de Pernambuco, desembarcou decidido a gravar seu segundo disco. “Mas quase ninguém parecia disposto a ouvi-lo até que Teles o ouviu, publicou a crítica, a cena do Recife se interessou, e começaram a aparecer os shows”, diz ele, sobre o veterano crítico José Teles, do “Jornal do Commercio”, do Recife.

“(...) A cada canção mais eu me perguntava de onde tinha saído aquele cara. Ninguém compunha mais daquela maneira. Pelo menos ninguém da geração nascida a partir da década de 80. Canções com começo, meio e fim, harmonias requintadas, como se fazia nos anos 60. Zé Manoel cantava acompanhando-se ao piano, em algumas faixas com uma banda. Me entusiasmei pela demo. Virou

trilha dos nossos papos no Frontal, um bar na Mamede Simões (point descolado do Recife, para quem não sabe). Devo ter convertido muita gente à música de Zé Manoel, a quem conheci, algum tempo depois, ali mesmo na dita Mamede (...)”, escreveu Teles no artigo-fronteira. As conversões a Zé Manoel, deste então (e felizmente), não param.


 

 



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