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Mariano Marovatto e seus atravessamentos
Publicado em 16/03/2017

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Carioca, radicado em Lisboa, artista fala sobre as novas pontes que ele e outros artistas nacionais vêm estabelecendo com a cultura portuguesa e comenta seu mais recente disco, “Selvagem”, um abraço entre as tradições musicais dos dois países

Por Fabiane Pereira, de Lisboa

Mariano Marovatto nasceu no dia primeiro de abril de 1982, na cidade do Rio de Janeiro, e desde o ano passado vive em Lisboa. Ao empreender seu atravessamento transoceânico, esse escritor, cantor e compositor consolidou também uma viagem de construção de pontes culturais, sentimentais. Parceiro musical de Romulo Fróes - um dos compositores responsáveis pelo discaço “A Mulher do Fim do Mundo”, de Elza Soares -, de Jonas Sá, Bruno Medina (ex-Los Hermanos), Domenico Lancelotti e muitos outros, Mariano tem três discos (sendo o mais recente o belo “Selvagem”), oito livros (a maioria de poemas) e parcerias com grandes nomes desta área de produção, como Francisco Alvim. Predicados apresentados, é hora de cravar: Marovatto é, sim, uma figura chave na sua geração e desponta como um multiartista de relevância no Brasil. Agora é a hora de Portugal.

“Selvagem” traz um repertório montado exclusivamente por temas folclóricos brasileiros e portugueses que foram deixados de lado pela linha evolutiva e pela memória musical do grande público nos dois países. Nenhuma faixa escolhida é autoral e sequer possui uma autoria definida. “Selvagem” não é só um resgate histórico, mas uma atualização “rebelde”, como quer o cantor, levando em consideração a sonoridade e os outros dois participantes do álbum: Pedro Sá, um dos guitarristas mais aclamados do Brasil, e a japonesa Ami Yamasaki, artista vocal, uma das principais expoentes da vanguarda sonora do Japão na atualidade.

Assim como os brasileiros são apaixonados pela literatura portuguesa, os portugueses amam nossa música, então não é surpresa encontrar artistas que atravessam as duas artes entre Brasil e Portugal. E, de uns anos para cá, esse êxodo parece ter aumentado. A cantora Adriana Calcanhotto, por exemplo, trocou o Rio por Coimbra para viver a experiência de lecionar numa das universidades mais antigas do mundo.

Conversamos com Mariano sobre os motivos que o fizeram trocar o Rio por Lisboa, sobre os atravessamentos que influenciam sua arte e, claro, sobre o álbum “Selvagem”.

 

Parece haver um êxodo de artistas brasileiros para cá. Por que será?

MARIANO MAROVATTO: É difícil eleger um motivo específico. No meu caso, um acúmulo de coisas me fez chegar até aqui. O amor pela cidade e pelos amigos que aqui vivem, a relação íntima com a cultura portuguesa, toda a minha ascendência, a vontade de atravessar o mundo, sendo atravessado por ele. Levando tudo isso em conta, a pergunta ficou mais fácil: por que não? Mas, do ponto de vista musical, saltam aos olhos de um cantor/compositor da Zona Sul carioca a assertividade da cena e da estrutura de Portugal e a natural receptividade do público português à música brasileira. A comparação é frequente, quase automática, e com certeza ficaríamos horas e horas debatendo o assunto, como sempre fazemos por aqui.

 

Uma das consequências dessa "diáspora" brasileira é o aumento dos atravessamentos culturais. Em que sentido essas novas possibilidades afetam sua arte?

Os atravessamentos estão presentes desde o momento de levantar da cama, quando você desperta e entende que nas ruas se fala português, mas não exatamente o mesmo português. Como disse, Portugal sempre foi mais receptivo à cultura brasileira do que o contrário. Acho que o principal dever do brasileiro deveria ser deixar-se levar, entender, ler, escutar, procurar saber o que é e como funciona a cultura portuguesa. Eu gostaria imenso que houvesse uma mão dupla verdadeira nessa troca. Estando aqui me pergunto diversas vezes por que não temos uma relação mais estreita com a música do Zeca Afonso, ou a do António Variações, e até mesmo com a Amália Rodrigues, que todos sabem quem é no Brasil, mas quase ninguém escuta. E isso também serve a todos os artistas lusófonos africanos. É uma coisa bastante canhestra evitarmos a troca cultural com a África quando metade da população brasileira é negra. É preciso ouvir o outro, sempre.

 

Passam por aí as razões pelas quais lançou o projeto “Selvagem”?

Os motivos de fazer o “Selvagem” se confundem com os motivos da minha vinda pra Portugal. Que são, basicamente: 1) a minha ancestralidade; 2) ter me dado conta do valioso material de canções que estavam diante de mim. “Selvagem” é feito exclusivamente de temas folclóricos brasileiros e portugueses. Escutar esse material, interpretar esse material e apresentá-lo em terras portuguesas é algo muito, muito potente. É como se o pessoal, o regional e o universal formassem um acorde. É lidar intimamente com essa língua e com o jeito em que ela sempre foi cantada. Está sendo muito mais incrível do que eu poderia imaginar apresentar o “Selvagem” aqui.

 

 


 

 



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