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A moda é bater na velha tecla... dos teclados vintage
Publicado em 08/02/2018

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Instrumentos antigos fazem a cabeça de jovens músicos e produtores, mas um experimentado criador adverte: o som dos 'trambolhões' não é para qualquer momento

Por Kamille Viola, do Rio

Eles marcaram época com seus timbres e são objeto de culto de muitos músicos. Os sintetizadores analógicos ajudaram a moldar sonoridades nos anos 70 e 80, mas foram sendo substituídos pelos teclados digitais. No entanto, de tempos em tempos, o interesse por eles é renovado. Nos últimos anos, o hype em torno deles tem sido tanto que fabricantes andam lançando instrumentos que emulam o som de alguns deles.

“Por mais que seja um teclado, ou seja, um som naturalmente artificial, ou seja, não é um piano, eles (os teclados vintage) têm uma coisa mais viva, mais brilhante... Têm mais alma. Também tem essa coisa fetichizadora com aquilo que passou, sempre tem, e aí eles acabaram ganhando um status, um charme”, analisa Arthur Braganti (na foto acima), tecladista e um dos produtores do disco de estreia do projeto Letrux, da cantora Letícia Novaes, ex-Letuce. “Os sintetizadores digitais tentam chegar muito perto do som dos outros instrumentos e, no fim das contas, acaba que fica uma coisa muito usada por muita gente, padroniza um tipo de sonoridade”, compara.

Dinho Zampier, da dupla Figueroas e do projeto Filme, com Cris Braun, é outro fã desses timbres. “Acredito que esse resgate do vintage era só questão de tempo”, comenta ele, que se encantou pelos antiguinhos antes mesmo de ser músico profissional. “O meu primeiro contato com os instrumentos vintage foi o meu primeiro professor, que era batista, e na igreja que ele frequentava ele tinha Hammond, Wurlitzer, piano. Eu ficava horas e horas sem querer sair de perto, ia até para os cultos para poder ver ele usando (um órgão) Hammond. Tinha uns americanos que também usavam, então aquela sonoridade me marcou bastante naquele período”, lembra.

No entanto, obter um desses exemplares era um sonho distante para ele, não só pelo preço. “A gente, de Alagoas, tinha que ir para Recife se quisesse comprar, aqui não tinha”, comenta. “Era muito difícil ter acesso, só mesmo acompanhando as apresentações de bandas que vinham do Rio, de São Paulo. Cheguei a ver Roupa Nova, Novos Baianos, A Cor do Som, uma turma que trazia uns tecladões vintage, e aquilo era uma coisa, ficávamos impressionados”, recorda Zampier.

Zampier em ação: "era muito difícil a gente ter acesso" 

Já Braganti foi seduzido por essas sonoridades muito por acaso. “No Séculos Apaixonados (projeto musical dele), eu tocava com um Roland Juno mais novo. Acabei perdendo quando tinha que fazer um show em São Paulo. O Dustan Gallas, do Cidadão Instigado, me emprestou um teclado Strings analógico, eu não conhecia. Um tempo depois, ele acabou precisando vender o instrumento, e eu o comprei. Uso muito. É bem pesado, difícil de transportar para shows, mas produz um som tão particular, tão único, que eu encaro e levo em turnê”, conta.

Mestre dos teclados, Fernando Moura, um dos maiores compositores de trilhas sonoras para o audiovisual brasileiro, nem sabe de cabeça quantos teclados antigos tem em seu estúdio, no Rio de Janeiro. Ele concorda que levar essas peças para shows e apresentações dá muito trabalho. “É aquela velha questão. Entre a flecha e o índio, não tem nem que pensar. A flecha pode ser legal, bonita, vistosa, mas é o índio que decide. Se não consigo carregar um trambolho desses, levo um digital e garanto que o índio se vira”, ele ri.

Moura exalta as peculiaridades sonoras que os instrumentos vintage podem oferecer mas também acredita que o som deles não é para todo momento. “A música que você quiser fazer naquele momento tem que pedir essa estética. É um som muito específico, essa coisa anos 80 não agrada a todo mundo. Um teclado digital pode resolver, às vezes melhor. Sem falar que o teclado vintage, principalmente o analógico, ocupa espaço colossal na mixagem. Muito mais difícil colocá-lo num volume ok em relação a guitarra, vocais. Não vai deixar espaço para ninguém, eclipsa todos os outros instrumentos”, pondera o compositor, que, mesmo não usando o tempo todo, não abre mão da sua pequena coleção, que inclui um Oberheim Expander, um Dave Smith Prophet 5, um Memorymoog e um Minimoog.

Fernando Moura em seu estúdio com alguns dos muitos teclados de que dispõe

Tanto sucesso (com direito a “leilões” de sintetizadores analógicos pela internet) levou empresas como a Moog a produzir réplicas fiéis de sintetizadores famosos. Moura cita ainda a empresa francesa Arturia, que lançou um programa que emula bastante bem os sons de todos os teclados vintage de uma vez. A Roland e a Korg, enquanto isso, relançaram clássicos analógicos em versão digital. As vantagens? Preço mais acessível e instrumentos mais leves, uma alternativa para quem não tem condições de pagar caro nem viajar com os pesadões.

“Eles estão trazendo de volta toda aquela sonoridade, hoje em dia com muito mais clareza e precisão. Uso vários, pela facilidade de levar esses instrumentos para o palco e obter timbres incríveis”, conta Zampier.

Arthur Braganti acredita que produtores gostam de usar teclados vintage não para imitar o som de outras épocas, mas para explorar novas possibilidades com eles. “Querem porque querem que o tipo de música lembre a que era feita na época desses synths, fazendo sons e coisas e timbres com técnicas de gravação contemporâneas para dar um contraste”, analisa. “Eu acho bom que um disco atual tenha coisas antigas, tem um poder essa coisa do velho estar no novo. ‘Letrux em Noite de Climão’ é um disco novo, de gente nova, lançado em 2017. Sempre acho que uma coisa assim me dá vontade de ter a coisa do velho forte, potente, filosófico na arte. As coisas são meio cíclicas, na música tem bastante disso. E eu estudei piano clássico a vida toda, estou ligado ao maior teclado vintage de todos, que é o piano”, diverte-se.


 

 



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