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Acampamentos de composição: revolução na forma de criar
Publicado em 21/06/2018

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Celso Fonseca conta sua experiência de quatro dias de produção ao lado de artistas de vários países e estilos, no início deste mês, na França

Por Alessandro Soler, de Madri

Nos anos 2000, as salas de escritores (writers' room, em inglês) revolucionaram a forma como se escreve para TV — primeiro nos EUA, depois nos resto do mundo —, ao provocar uma saudável digladiação entre roteiristas de um determinado produto. A lógica é: muitas mentes pensando junto depuram melhor as ideias. O resultado foi a elevação de algumas séries ao mesmo nível técnico e artístico de grandes filmes do cinema. 

Agora, um novo modo de produção espera revolucionar também a criação musical. Populares em outros países, os chamados songwriting camps (ou acampamentos de composição, em tradução livre) se multiplicam também pelo Brasil, sob facetas variadas, seja focando um estilo específico, seja juntando criadores de origens e estéticas completamente distintos, com a ideia de ver no que dá. As parcerias que surgem ali, insuspeitas, inusitadas, de fato podem surpreender e, potencialmente, derivar em novos estilos, novas formas de pensar. 

Celso Fonseca (foto), o cantor, compositor e guitarrista carioca, veio à Europa para participar de um deles, no início deste mês, na França. Foi durante a maior feira de música do planeta, o Midem, que todo ano toma o balneário de Cannes por alguns dias. Junto a 12 outros artistas de lugares como Japão, Suécia, França, Estados Unidos, Nigéria, Reino Unido, Noruega e Espanha, ele viveu uma experiência que define como “acima de qualquer expectativa, rica e transformadora”. 

Confira abaixo o depoimento que Celso deu ao nosso site. 

“Foi a primeira vez que participei de algo assim. Tenho escutado muito sobre songwriting camps, mas nunca tinha tido a oportunidade de ir a um deles. Já compus com muitos parceiros nestes 30 anos de carreira, claro, mas algo assim é completamente novo e impressionante. Eu recebi um convite para me trancar nesta casa, ao longo de quatro dias, com esses outros criadores superinteressantes de vários países. Eu não os conhecia, apenas tinha recebido uma relação com os nomes deles. Logo entendi que eram não só de países muito diferentes, mas também de gêneros e backgrounds bem distintos. Fui sem expectativa, mas muito animado. 

Ali, éramos reunidos a cada dia em grupos de três pessoas a fim de criar algo juntos. Fiz coisas que provavelmente não teria feito sozinho. No primeiro dia, fiz com meu grupo um pop que poderia perfeitamente ser gravado por Rihanna ou Beyoncé (risos). No segundo, um hip hop. E por aí vai. Não havia briefing, não nos pediam nada específico. A ideia era deixar fluir o que pudéssemos criar. Nos sentávamos num estúdio na casa e passávamos até 12 horas criando, compondo, trocando experiências. E a interação humana também era muito rica. A única obrigação era fazer uma música por dia e gravar pelo menos a voz, deixá-la registrada. 

Algumas das coisa que surgiram são realmente boas, estamos animados. Muitos de nós temos mantido contato, criamos grupos de mensagens. A ideia é levar essas composições adianta, gravá-las, oferecê-las a outros intérpretes. Ao todo, foram 18 canções criadas. 

Não há dúvida de que esse tipo de dinâmica — juntar gente de várias partes, encerrá-las num lugar e deixar a criatividade fluir — é um símbolo de uma nova era colaborativa, de produção coletiva. E que rompe preconceitos de gênero, de mistura, de origem, de tudo. 

Com as tecnologias de mensagens instantâneas, de comunicação imediata, é possível estar em contato virtual com muita gente, mas estar cara a cara criando, trocando, é muito mais rico, é outra coisa. 

Não que fosse tudo harmonia e concordância. Também havia pontos dissonantes, havia debate, havia discordância, e isso é ainda melhor. Além disso, foi bacana ver gente que tem um modo determinado de produção, com menos acordes, menos harmonias, abrindo-se a outros estilos, escutando, adaptando-se. Havia visão crítica e colaborativa e generosidade para ouvir e mudar. 

Sei que essa fórmula tem entrado com força também no Brasil, inclusive em acampamentos de estilos específicos, como o sertanejo. Recomendo enfaticamente a todos que possam que participem de pelo menos um songwriting camp. Isso é o futuro, mas já é também o presente. 

Colaboração, encontro, troca, crítica construtiva, adaptação: só pode fazer bem. Não apenas para a música, mas para qualquer forma de criar e pensar.”

Celso Fonseca, cantor, músico e compositor


 

 



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