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Como o fechamento de teatros afeta os criadores de música
Publicado em 14/01/2021

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Autores de trilhas para peças, musicais e outras obras dramático-musicais, assim como os músicos que participam dos espetáculos, podem ter suas receitas geradas de outras maneiras, explica especialista

Por Ricardo Silva, de São Paulo

A paralisia do setor cultural por conta da pandemia não prejudicou apenas a receita dos compositores provenientes de shows; quem cria canções para peças de teatro (ou tem suas obras inseridas nelas) também se viu afetado pela ausência de apresentações nestes meses. Uma aparente alternativa — a transmissão de peças, musicais, óperas e outras obras do gênero dramático-musical através de canais de TV, de serviços de streaming e sites da internet — pode ser uma saída para obter receita com direitos autorais. Mas não é simples a comparação entre as duas formas de uso de obras dramático-musicais — ao vivo e diante do público, ou fixado por ocasião de uma transmissão ao vivo — no que diz respeito à receita de direitos autorais das músicas contidas nelas.

Segundo a advogada e educadora Marisa Gandelman, com décadas de experiência no universo dos direitos autorais, a ausência de público nas encenações já faz os titulares de direitos perderem, de saída, os percentuais a que têm direito sobre a venda de ingressos, estabelecidos em acordos entre o Ecad e a APTR (Associação dos Produtores de Teatro). Por outro lado, o resultado de bilheteria é sempre variável e difícil de ser previsto.

Em todo caso, mesmo sem a receita de participação em bilheteria, há a cobrança de direito de execução pública pela transmissão das obras em streaming e TV. No entanto, transmissões pelas plataformas de streaming geram uma receita que Marisa classifica como insignificante, em razão dos valores geralmente muito baixos pagos pelos streams. Por isso, a modalidade streaming não chega a gerar grandes ganhos aos titulares, sem falar na dificuldade de aferir os dados dessas transmissões, para que o dinheiro chegue ao autor (veja mais abaixo, no tópico “Ausência de cue-sheets, um problema”).

"No caso da TV (radiodifusão ou por assinatura), isso não acontece. As práticas de cobrança e regras de distribuição estão bem organizadas e consolidadas. Existem regras de distribuição que destinam verba específica para programas transmitidos ao vivo", diz Marisa.

No entanto, a falta de familiaridade dos profissionais do mundo do teatro e dos espetáculos dramático-musicais com as regras e práticas da produção audiovisual suscitou muitas dúvidas referentes aos direitos devidos, quem autoriza e quem paga o quê e para quem. Já o mundo da execução pública de música chegou a cogitar a cobrança aos produtores das peças transmitidas ao vivo, seja pela TV ou por streaming, como se de uma live musical se tratasse. 

“Não se trata de um show musical transmitido pela TV ou pela internet porque não pode ser feito no teatro, com bilheteria. A finalidade não é a fixação para criar um produto fonográfico ou videofonográfico. Se houver uma cobrança específica de ingresso para acesso à transmissão pela internet, ou remuneração por meio de doação de ouvintes, ou pagamento pelo canal de TV pelo direito de transmissão ou uma verba de patrocinador, é justo que haja uma cobrança específica do Ecad ao produtor da live, ou uma regra de distribuição que permita valorar a verba a ser distribuída especificamente para as músicas tocadas em cada uma desses shows”, ela conceitua.

Caso diferente é quando a peça, ópera ou musical dão origem a um outro tipo de produto, esse sim audiovisual. Isso ocorre, por exemplo, quando o produtor do espetáculo dramático-musical traz profissionais do audiovisual, como um diretor de imagens que transforma aquela obra utilizando uma linguagem cinematográfica ou televisiva, visando à fixação num suporte tangível (CD, DVD) ou intangível (digital). Neste caso, o produtor precisa dar conta de outro direito: o de sincronização das obras musicais que passam a integrar a obra audiovisual. O produtor precisa também da expressa autorização de todos os intérpretes para a fixação de suas respectivas interpretações e ajustar a remuneração de cada um considerando a futura comercialização do produto audiovisual. 

“Em outros países, é comum o produtor transformar um musical ou peça em vários produtos: fonográfico e audiovisual. Contrata um diretor de audiovisual, alguém que trabalha com cinema ou TV, e adapta a peça ou musical originais a um novo formato, totalmente diferente, com recursos realmente audiovisuais de luz, edição, sem falar nos recursos tecnológicos de pós-produção. Adota-se efetivamente outra linguagem. Com novos usos, os titulares passam a ganhar através de fontes mais diversas. Seria um bom caminho a ser melhor explorado por aqui”, diz Marisa.

Ausência de cue-sheets, um problema

Para que os valores normais de execução pública pela eventual transmissão de peças, óperas e musicais no streaming cheguem até os titulares, é fundamental o correto preenchimento de um documento que já explicamos em reportagens anteriores aqui no site, o cue-sheet. Trata-se de uma ficha técnica do uso de obras musicais em produtos audiovisuais, com informações detalhadas sobre o tipo e o tempo de uso e os titulares envolvidos. Ocorre que, se já há grandes lacunas no fluxo de preenchimento de cue-sheets para transmissões já “consagradas” (como a de um filme ou de um show gravado na TV), ainda mais falho é o processo no caso de transmissões efêmeras como de uma peça de teatro no streaming. 

Com isso, os titulares dificilmente receberão algum valor por conta da transmissão dessas obras. E, como já dissemos acima, ainda que houvesse o cue-sheet, os valores seriam muito baixos, dadas as remunerações muito pequenas propiciadas pelas plataformas de streaming em geral.

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