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Chacrinha, curador musical das massas
Publicado em 30/09/2022

Décadas antes das playlists, Velho Guerreiro — nascido num 30 de setembro, há 105 anos — teve papel vital na difusão do pop-rock

Por Kamille Viola, do Rio

Paramentado em cena: estilo inigualável. Divulgação/livro "Chacrinha —A Biografia"

exatos 105 anos, nascia um dos personagens mais marcantes da história da televisão: José Abelardo Barbosa de Medeiros, o Chacrinha. Radialista e apresentador de programas de auditório, ele fez sucesso por três décadas como um curador de novos artistas — muito antes de as playlists sonharem em existir — e criando bordões até hoje lembrados, além de ter quebrado a sisudez da TV com um programa completamente fora dos padrões. Morto em 1988, aos 70 anos, o Velho Guerreiro foi homenageado em desfile de escola de samba, documentários e musicais, e ficou na memória do país como um dos maiores comunicadores que já tivemos por aqui.

Para o escritor e pesquisador Denilson Monteiro, autor de “Chacrinha — A Biografia” (ed. Casa da Palavra), o segredo do sucesso do apresentador era sua espontaneidade, já que, na época em que ele surgiu (em 1957, na Tupi), a TV ainda era muito formal, e ele rompeu com isso.

“Ele improvisava, se movimentava. O programa dele era dinâmico, ele sempre procurava alguma coisa nova, lançava novos artistas, um quadro novo, novos bordões. Ele não se acomodava”, diz.

Em uma época em que a indústria fonográfica só crescia, e a televisão se popularizava cada vez mais, aparecer em seu programa era sinônimo de ter sua carreira alavancada. Ele impulsionou carreiras que vão desde nomes hoje pouco lembrados, como Sarajane, Gilliard, João da Praia, César Sampaio e Marcus Pitter (1950-2022), aos Titãs, Paralamas e Barão Vermelho. Foi Chacrinha que rendeu a Roberto Carlos o epíteto que o acompanha até hoje, ao realizar sua coroação como Rei da Juventude na Discoteca do Chacrinha, na TV Excelsior, em 1966.

Com um jovem Roberto Carlos em foto sem data. Divulgação/livro "Chacrinha — A Biografia"

Habituée do Cassino do Chacrinha, que estreou na Globo em 1982, Simone já era conhecida do público quando começou a frequentar a atração. Mas, ainda assim, sente que as aparições que fez tiveram impacto em sua carreira.

“Eu lancei muitas músicas lá. Um dos sambas-enredos que eu gravei foi lançado lá, acho que ‘Disputa de Poder’. Recebi discos (certificações por vendas) lá, participei muitas vezes”, diz. “Ele era superpopular. Ajudava muito os artistas. Quando eu ia lá, sempre havia comentários depois: ‘Te vi no Chacrinha’”, lembra ela.

A cantora conta que, se no palco a atmosfera era de festa, nos bastidores não era diferente.

“Você encontrava os amigos, todos ficavam juntos no camarim, tinha um clima familiar, sabe?” Ela lembra que o apresentador não costumava ser visto nos camarins. Isso tinha um motivo: o Velho Guerreiro sempre ficava nervoso. “Entre os artistas havia uma grande confraternização, mas ele ficava muito tenso antes de o programa começar. Tinha até cólica, Ele tinha um temor muito grande de que alguma coisa desse errado, que não desse audiência”, explica.

Simone. Foto: Nana Moraes

Esse medo acabou colocando Chacrinha em apuros. Quando apresentava um programa na TV Bandeirantes (onde ficou de 1978 a 1982), uma censora queria examinar o maiô das Chacretes, as dançarinas que trabalhavam com ele, e o apresentador não aceitava que ninguém se metesse na atração.

“Ele estava atrasado, aquele pânico, e essa senhora veio querer falar com ele. Ele não viu identificação nenhuma e xingou, porque, irritado, ele costumava ser bem desbocado. O programa acabou, ele foi conduzido até o Dops (Departamento de Ordem Pública e Social, unidade ativa na repressão aos dissidentes da ditadura), preso, algemado, com aquele figurino dele, para prestar esclarecimentos”, conta o biógrafo Denilson Monteiro.

Outra coisa que o irritava profundamente era dizerem que havia “jabá” para tocar no seu programa. Jurava que escutava rádio para escolher quem convidaria a cantar por lá. Porém, Leleco Barbosa, filho e produtor do apresentador, admitiu que havia uma espécie de troca de favores.

“Depois que o artista começava a fazer sucesso, havia uma cobrança: muitos eram chamados a se apresentar nos shows que ele fazia pelo país. Era uma coisa estilo ‘uma mão lava a outra’”, revela Monteiro. “Ficou famosa a história do Ritchie, que não pôde ir num desses shows, o Leleco se aborreceu e proibiu o Ritchie de se apresentar no programa, considerou aquilo uma ingratidão”, recorda.

O pesquisador e escritor Denilson Monteiro. Arquivo pessoal

Simone conta que, já no fim da vida de Chacrinha, gravou uma música a pedido dele: “Kalu”, de Humberto Teixeira (no disco “Sedução”,1988). Para ela, os principais trunfos do apresentador eram sua criatividade e irreverência.

“Ele foi muito importante como comunicador, como lançador de artistas. Sempre tinha surpresa, você nunca sabia o que estava por vir com ele. O programa estava dentro da Globo, mas tinha sua independência”, analisa. “Eu acho que ele faria sucesso em qualquer época. Ele era diferente de tudo. Era muito ousado”, finaliza.

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