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Cada vez menos compositores vivem só de escrever música, diz pesquisa global
Publicado em 22/07/2025

Apenas 1 em cada 5 criadores prioriza a escrita, segundo o MIDiA Research; interpretação e redes sociais são saídas para aumentar renda

Por Nathália Pandeló, do Rio

A figura do compositor que escreve músicas exclusivamente para outros artistas está desaparecendo. Um relatório recente da MIDiA Research, baseado em uma pesquisa com 776 criadores musicais de vários países, mostra que apenas um em cada cinco profissionais tem a composição como atividade principal. A maioria já acumula funções como cantar, produzir, apresentar-se ao vivo, construir presença nas redes sociais e, em muitos casos, abrir negócios paralelos para garantir estabilidade financeira. 

Esse movimento, que preocupa entidades como a National Music Publishers Association (NMPA), nos Estados Unidos, também encontra eco no Brasil, como revelam as experiências de dois grandes criadores e associados da UBC: Celso Fonseca e Bibi (leia mais abaixo).

Outro dado do relatório chama atenção: os compositores que investem em visibilidade digital, inclusive em plataformas como SoundBetter e BandLab, conseguem ter mais lançamentos próprios e renda acima da média do mercado. Ao mesmo tempo, apenas cerca de 20% colocam “construir uma marca pessoal” entre as metas prioritárias, mostrando que nem todos desejam ou conseguem embarcar nessa estratégia. 

Esse cenário evidencia um mercado de bifurcação. Enquanto alguns se reinventam como intérpretes ou produtores, outros acabam ficando para trás.

ESCOLHA OU NECESSIDADE?

A realidade de divisão entre escolha e necessidade aparece de diferentes formas nas trajetórias de artistas brasileiros. Enquanto alguns sempre circularam naturalmente por múltiplos papéis, outros passaram a expandir suas atuações motivados pelas mudanças no mercado e pela busca por sustentabilidade financeira.

Celso Fonseca, autor de mais de 300 canções gravadas, oito vezes indicado ao Grammy Latino e vencedor do Grammy na categoria World Music, conta que, em sua trajetória, suas diferentes facetas caminharam juntas:

“Desde o começo da minha carreira, essas funções sempre estiveram muito misturadas. Sempre fui compositor, instrumentista, cantor e produtor, por vocação e vontade de aprender e me expressar de várias maneiras possíveis.” 

Celso Fonseca. Foto: arquivo pessoal

Ele ressalta que nunca teve como meta buscar o sucesso comercial, mas que os hits vieram como consequência natural do trabalho.

Já a cantora e compositora Bibi lembra que sua entrada como intérprete aconteceu por uma razão criativa, não estratégica. 

“O desejo de ser cantora, na verdade, me acompanha desde os 5 anos de idade. Depois de vários anos escrevendo para vários artistas e segmentos diferentes, acumulei poucas mas importantes canções às que senti que só eu poderia dar voz. Meu projeto como cantora surgiu pelo chamado das próprias composições”, recorda.

Apesar de trajetórias diferentes, ambos reconhecem que hoje o mercado impõe desafios financeiros a quem tenta viver apenas de composição.

“Você escreve uma música imaginando que, com sorte, ela pode ser gravada e lançada daqui a pelo menos seis meses e, depois disso, serão ao mínimo outros seis meses para que essa arrecadação seja significativa. Por esse motivo, alguns segmentos passaram a cobrar valores para a liberação ou exclusividade de uma obra, e outros, o valor de diária de trabalho”, Bibi explica.

Segundo ela, essa prática reflete como cada nicho consegue ou não gerar renda. Já Celso concorda que, para quem se dedica a “apenas” compor, o desafio é ainda maior. 

“A dificuldade para quem não canta e só escreve letras continua a mesma. É preciso um intérprete para mostrar sua composição. Acho que nem todo compositor necessariamente é um intérprete. Vejo muitos fazendo isso hoje em dia e acho que pode, sim, funcionar, mas não necessariamente, já que existem muitos outros fatores envolvidos nessa equação”.

O cantor e compositor observa que, embora as plataformas digitais tenham democratizado o acesso, também ampliaram a concorrência, tornando mais difícil se destacar.

REDES COMO VITRINE

O relatório da MIDiA mostra que muitos compositores estão usando as redes sociais como vitrine para ampliar seu público e conquistar oportunidades. Para Bibi, esse movimento é real. 

“Numa era em que fazer com que as pessoas saibam da sua existência e excelência em algum ofício, (as redes são) o primeiro passo para que você seja contratado. Para muitos compositores e compositoras, a carreira de intérprete é uma vitrine da sua identidade autoral. No formato que a indústria caminha nos últimos anos, ser intérprete também é uma árdua tarefa que depende não só do talento, mas da formação de um time e de grandes investimentos. Por isso, o caminho de crescer nas redes vem como uma alternativa por não depender tanto de outras pessoas e possibilitar novas formas de renda.”

Bibi. Foto: arquivo pessoal

Ela cita também o impacto de uma maior notoriedade que tantos compositores almejam:

“(Quando) a carreira de cantora deslancha, é incomparavelmente maior o desempenho que essa visibilidade pode impactar na carreira de compositora.”

Celso traz um contraponto sobre os riscos de seguir tendências de mercado. Ele acredita que sucessos duradouros nascem de conexões verdadeiras com o público, não de fórmulas prontas.

“Quanto mais o compositor for fiel ao seu estilo e à sua maneira de dizer as coisas, mais universal ele será. Acho que a eterna busca pelo que está funcionando no mercado é uma solução que pode funcionar a curto prazo, mas não é garantia de uma carreira longa e bem-sucedida.” 

Bibi complementa dizendo que, no meio dos compositores, a presença online nem sempre pesa tanto. 

“Na comunidade de compositores, ao longo dos anos e da experiência, vamos compreendendo os pontos fortes de cada um. Mas, para artistas (intérpretes), acredito que sim, ter público próprio e presença online influencia.” 

Ela destaca também a importância das parcerias criativas, como nos camps de composição, onde o foco está mais no processo do que na imagem pública.

 

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