Data será comemorada anualmente em 17 de fevereiro; compositor Manno Góes celebra cena ‘que colocou a Bahia no mapa do mundo’
De Brasília e Salvador*
Foto: Agência Brasil
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou a lei 15.189, que institui o 17 de fevereiro como Dia Nacional da Axé Music. A oficialização da data, publicada no Diário Oficial da União na quinta-feira (7) coroa um processo que teve origem num projeto de lei (4.187/2024) de autoria da deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA), aprovado em fevereiro deste ano antes de seguir para tramitação e votação no Senado, onde também foi aprovado no início de julho, com parecer favorável da senadora Augusta Brito (PT-CE).
No ano em que a axé music completa quatro décadas de existência, a homenagem garante que um gênero que marcou para sempre o nosso carnaval seja devidamente reconhecido.
Em seu relatório, a senadora Augusta Brito lembrou que o axé desempenha papel fundamental na valorização da diversidade e no resgate das raízes afrodescendentes, além de contribuir para a geração de emprego e renda.
“Mais do que entretenimento, o gênero expressa valores de resistência, celebração e coletividade, sendo vetor de inclusão social e econômica, sobretudo no estado da Bahia, onde impulsiona a geração de emprego e renda, especialmente durante o ciclo carnavalesco”, registrou.
Ela citou dados da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Salvador, segundo os quais o carnaval de 2024, com programação marcada pela forte presença da axé music, movimentou cerca de R$ 2 bilhões e gerou mais de 60 mil postos de trabalho temporários. Mesmo com a proliferação de outros gêneros nos últimos anos, a ligação entre a axé music e os festejos soteropolitanos é indissociável.
“E o papel da cena axé na cultura e na economia, não só da Bahia, mas de todo o Brasil, é fundamental”, sintetizou Lídice da Mata ao propor o projeto.
REPERCUSSÃO
Para o diretor da UBC Manno Góes, compositor baiano e testemunha da força e do alcance da axé music ao longo das últimas décadas, essa cena tão poderosa “colocou a Bahia no mapa do mundo e na mira da indústria fonográfica”:
“Recebemos com muita alegria a sanção do projeto de lei que institui o dia 17 de Fevereiro como o o Dia Nacional da Axé Music, um projeto lindo da deputada Lídice. A axé music nasceu das ruas, do carnaval, da criatividade de um povo e do seu sincretismo religioso. Impulsionou a economia criativa da cidade, gerou empregos, movimentou o turismo, colocou a Bahia no mapa do mundo e na mira da indústria fonográfica; enfim, mudou o estado. Uma homenagem justa, merecida, de um movimento que nos orgulha de ser baianos.”
Como mostramos na edição de março da Revista UBC, o marco zero da axé music foi o álbum “Magia”, de Luiz Caldas , que já sinalizava o que seria aquele fenômeno. O artista sintetizou o ijexá, o frevo eletrificado do carnaval, com merengue, salsa, reggae e pop e apontou para o futuro. Um álbum seminal, que resumia o ambiente da música baiana no período, a promover de forma natural uma mistura de ritmos e encontro de referências.
‘Magia’ caiu no gosto popular, vendeu mais de 100 mil cópias só na Bahia e apresentou alguns hits que se tornaram marcantes na música baiana e brasileira. O maior destaque e puxador do trabalho foi a música "Fricote", conhecida como “Nega do Cabelo Duro”, que impulsionou todo o sucesso de Luiz Caldas a partir dali.
Aquela primeira bomba daria lugar a todo um movimento que reverberou anos a fio, com um auge nos anos 1990, trazendo um legado amplo: centenas de hits, uma infinidade de artistas que ajudaram a mostrar ao mundo a força da percussão baiana, e dois gêneros derivados, o samba-reggae e o pagode baiano. Não menos importante: a axé music deixou gravada para sempre uma enorme influência na música brasileira, que a nova data oficializa e institucionaliza.
TERMO NASCEU PEJORATIVO
E a própria história da origem do nome evidencia seu caminho de um gênero de "fora do eixo" para um papel protagônico no mainstream nacional. Naqueles meados dos anos 1980, a sonoridade suingada foi apelidada como “deboche” ou “fricote”. A denominação axé music só veio dois anos depois, em 1987, criada de forma pejorativa pelo jornalista Hagamenon Brito.
“O termo "axé music" surgiu em 1987, em minhas críticas musicais e textos no jornal A Tarde. Na minha geração roqueira baiana, muito influenciada pelo punk e pós-punk, desde os primeiros anos da década de 1980, algumas pessoas usavam o termo axé como sinônimo de coisa brega, de gosto estético duvidoso, e sem qualquer relação com a nobreza que o termo tem na cultura iorubá e na religiosidade afro-brasileira”, lembrou Brito à UBC. "Com o sucesso de Luiz Caldas, com suas roupas coloridíssimas de hippie tropical, brincos imensos nas orelhas, pés descalços e dança exótica, e a ambição dos artistas daquela geração em fazer sucesso até no exterior, eu juntei a palavra axé ao sufixo inglês music como forma de ironizar as pretensões daquela cena. Inicialmente, eles detestaram o rótulo, mas ele pegou no showbiz e em toda a imprensa do Rio e de São Paulo, também, e acabou virando uma expressão que deu identidade a uma nova geração de músicos baianos e brasileiros.”
*Com informações da Agência Senado, em Brasília, e de Luciano Matos, de Salvador
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