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TikTok poderá permitir a criadores de vídeos cobrar assinatura
Publicado em 16/02/2023

Cobrança se soma à publicidade e outras formas de monetização e levanta questões sobre pagamentos a titulares de direitos autorais das músicas

Por Alessandro Soler, de Madri

O TikTok estuda permitir que seus criadores instituam um paywall (uma barreira de acesso pago) para que os usuários vejam seus vídeos. A informação, atribuída a fontes da plataforma chinesa mas ainda não confirmada oficialmente, tem sido publicada em diferentes veículos de comunicação esta semana, como os prestigiosos sites de notícias The Information, Insider e The Verge. Segundo essas fontes, a ideia é que os criadores de conteúdos da plataforma decidam livremente se querem ou não cobrar, além de estabelecer seus próprios preços — os relatos falam em assinaturas a partir de US$ 1. 

Esta nova forma de monetização, que se soma à publicidade e às moedas próprias do TikTok — usadas pelos usuários para “presentear” os criadores dos conteúdos que mais os agradam —, levanta novas questões sobre os lucros crescentes do app, em oposição aos insuficientes pagamentos aos titulares de direitos autorais das músicas. Um estudo do próprio TikTok publicado em 2021 revelou que, para 88% dos usuários, as canções são “a alma” dos vídeos publicados ali, e sua presença os torna mais interessantes.

FATURAMENTO DE US$ 12 BI EM 2022

Segundo estimativa da agência de notícias Bloomberg não validada pelo balanço anual da empresa — que ainda não foi publicado —, o faturamento líquido do TikTok no ano passado teria chegado a US$ 12 bilhões. A sua média de pagamentos de royalties à indústria musical pelas canções usadas nos vídeos tem girado em torno de 4,5%, o que se traduziria em US$ 540 milhões repassados a gravadoras e agregadores digitais. São estas que se encarregam, por sua vez, de pagar aos titulares de direitos autorais. 

Ocorre que, diferentemente de Spotify, Apple Music ou mesmo YouTube, não há valores pré-fixados por stream a serem repassados aos titulares pelo TikTok. Nem percentuais universais. Tudo depende dos contratos particulares celebrados entre, de um lado, os próprios compositores, músicos e intérpretes, e, de outro, os distribuidores digitais ou selos que os representam junto à plataforma. De acordo com a consultoria digital SoundCampaign, distribuidores independentes internacionais como Tunecore, entre outros, teriam acordos com seus titulares associados para pagá-los por vídeo, e não por stream. 

Assim, não importa quantas visualizações terá um vídeo em que sua música apareça; você só receberá mais dinheiro se a sua obra viralizar tanto a ponto de começar a pipocar em diferentes vídeos subidos por usuários variados. Também segundo a SoundCampaign, a média de pagamento ao titular de direitos autorais musicais seria de 3 centavos de dólar para cada vídeo em que sua canção apareça. Ou seja, para receber algo como US$ 3 mil, vai ser preciso que sua música esteja em cem mil vídeos diferentes, o que é considerado uma altíssima viralização.

Vale fazer um parêntesis aqui, quando falamos do Brasil. No nosso país, o Ecad fechou com o TikTok, em 2021, um acordo para o pagamento de direitos de execução pública aos autores das músicas e também aos titulares de direitos conexos (intérpretes, músicos e produtores fonográficos). Portanto, neste caso, sim, há valores por stream, que são repassados pelas associações que compõem o Ecad — a UBC entre elas — nas distribuições trimestrais de streaming. 

FÃS JÁ GASTAM QUASE US$ 1 BI NO TIKTOK POR TRIMESTRE

A decisão do TikTok de abrir a possibilidade de cobrança para ver vídeos teria se dado após estudos internos que verificaram uma grande predisposição dos usuários para gastar dinheiro ali dentro. De acordo com a empresa de pesquisas Sensor Tower, só no último trimestre de 2022 o estimado 1 bilhão de usuários ativos mensais da plataforma gastou mais de US$ 914 milhões nela. 

A esmagadora maioria do dinheiro teria ido parar em moedas virtuais do TikTok para presentear criadores de conteúdo. Outra parte teria sido destinada pelos próprios criadores de conteúdos às suas assinaturas “premium”, com funcionalidades diferenciadas para eles, uma modalidade lançada em maio do ano passado e que ainda não pegou totalmente.

O PERIGO DA ERA DAS 'GORJETAS'

O analista do mercado musical Stuart Drede, do portal MusicAlly, reflete sobre a decisão do TikTok inserindo-a num contexto maior: a era das “gorjetas” — ou do financiamento direto dos fãs aos seus criadores e artistas favoritos — pode ter se instalado nas mídias sociais e no streaming de vídeos e de música.

“Nós ainda tendemos a pensar nas grande plataformas de mídia social como gratuitas e sustentadas por publicidade. Contudo, todas elas agora dispõem de ao menos uma camada de monetização direta dos superfãs, gente disposta a dar dinheiro aos seus astros e canais favoritos”, descreve. 

Mesmo plataformas de streaming de músicas, ainda amplamente baseadas na dicotomia anúncios (contas freemium) versus assinaturas (contas premium), também vêm testando modelos em que os fãs financiam diretamente seus ídolos. O Spotify é um exemplo recente: durante a pandemia, criou um botão de ajuda aos artistas, em que os fãs e assinantes podiam fazer doações aos seus ídolos, e estes decidiam se ficavam com o dinheiro ou se o repassavam a outros artistas afetados pela paralisação do mercado musical. 

Enquanto as plataformas se recusam a revisar sua política agressiva e competitiva de preços cobrados aos assinantes (nos Estados Unidos e na Europa, as assinaturas do Spotify custam os mesmos US$ 9,99 e € 9,99, respectivamente, há mais de dez anos), ao mesmo tempo em que não se empenham em renegociar contratos para pagar melhor aos titulares de direitos autorais, a cultura da “gorjeta” se dissemina. 

“Imagine esta cena do final de 2023: a) O TikTok lançou os vídeos para pagamento através de paywall no seu app; b) a ByteDance, companhia-mãe do TikTok na China, consegue espalhar globalmente sua plataforma Resso, grandemente vinculada ao TikTok; c) a cultura da gorjeta e as assinaturas de perfis de criadores, além do conteúdo com paywall, viraram a espinha dorsal desses serviços. (…) No nosso mercado, as gorjetas são associadas a músicos de rua, ou seja, amadores. Músicos profissionais deveriam estar além disso, certo? Mas será que está havendo uma mudança de cultura?”, pergunta o analista.

Uma pergunta que nos leva a reflexões: com o eventual sucesso do novo modelo da "gorjeta", mais plataformas, como YouTube, Apple Music ou Amazon, poderiam aderir a ele. E, se derem por bom e suficiente o pagamento direto feito pelos fãs, será que essas plataformas se eximirão de melhorar os percentuais de direitos autorais detinados aos criadores de canções que são, em muitos casos, a base do seu negócio multibilionário?

 

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