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Merchandising na música gerará quase R$ 100 bilhões em 2030
Publicado em 19/11/2024

Dado é de estudo do MIDiA Research, que revela: 25% das vendas atuais não geram ganhos para os detentores de direitos

Por Nathália Pandeló, do Rio

O mercado global de produtos promocionais musicais está projetado para crescer até atingir US$ 16,3 bilhões (R$ 94,5 bi) em 2030. Essa previsão, parte do estudo “Music merchandise demand”, do MIDiA Research, traz uma visão detalhada sobre as transformações e o ritmo de expansão de um setor que é frequentemente tido como uma das grandes pernas da indústria musical para os próximos anos.

Sobre toda essa expectativa que existe ao redor das receitas com merchan, porém, o trabalho do centro de pesquisas inglês é claro: a taxa de crescimento anual do setor deve se situar em coisa de só 1,6% nos próximos anos.

“À medida que o mercado se tornou mais sofisticado, as expectativas dos fãs por qualidade aumentaram”, justifica Tatiana Cirisano, analista sênior de Música e consultora da MIDiA Research. “Mas as gravadoras que focam em monetizar a base de fãs correm o risco de exagerar na dose — explorando esse recurso até o ponto de diminuir os lucros.”

Segundo ela, o futuro depende da capacidade da indústria de promover um consumo sustentável, que mantenha o engajamento dos fãs sem esgotar suas possibilidades de compra.

O estudo da MIDiA revelou que cerca de 25% das compras de merchandising atualmente são feitas por meio de vendedores não oficiais ou do mercado de segunda mão. A estatística é quase equivalente às compras diretas nos sites oficiais dos artistas e nas tradicionais banquinhas de produtos durante os shows. 

Essa realidade mostra que uma parte relevante do mercado ainda opera sem gerar ganhos contínuos para os detentores de direitos musicais. Ou seja, muitos itens comercializados escapam do controle e do retorno financeiro para os compositores, artistas, músicos e gravadoras. Isso expõe uma lacuna na estratégia de monetização dos direitos, já que uma fatia significativa das receitas potenciais vai para canais que não repassam seu quinhão aos criadores.

Ainda assim, Baggio, sócio proprietário da House Brands, vê o potencial do mercado de merchandising de perto. A empresa trabalha desenvolvendo, produzindo e gerenciando a logística de vendas de produtos oficiais de artistas como Anitta, Dilsinho, Sorriso Maroto, Mumuzinho, Juliette, Matheus & Kauan, entre outros.

“A questão dos vendedores não oficiais e do mercado de segunda mão é algo que deve ser monitorado, mas não vejo como um problema significativo. Com a colaboração dos próprios eventos, conseguimos minimizar esse impacto. A grande vantagem dos produtos oficiais é a qualidade e a exclusividade que oferecem. Os fãs, na maioria das vezes, sabem que os itens oficiais são superiores”, diz.

Produtos criados pela House Brands. Reprodução

 

VINIL É 'MERCHAN'?

O novo relatório da MIDiA também destacou uma tendência curiosa: a compra de LPs e CDs não apenas para escutar música, mas como itens colecionáveis. Uma pesquisa realizada pela empresa de dados de vendas de música Luminate revelou que, nos Estados Unidos, 50% dos consumidores que adquiriram discos de vinil não possuem uma vitrola em casa. Esse dado sugere que muitos compradores veem os discos mais como itens colecionáveis ou objetos de decoração do que como mídias para audição.

Esse comportamento, impulsionado principalmente por millennials e pela geração Z, consolidou a “febre do merchandising”, que teve um pico em 2024. Esdras Nogueira, do Móveis Coloniais de Acaju, avalia como esse fenômeno já era percebido em suas experiências com a banda ainda no início dos anos 2000. 

Segundo ele, a preparação de produtos exclusivos para turnês foi essencial para impulsionar as vendas e manter o interesse dos fãs.

“Nós pensávamos na temática do disco e desenvolvíamos produtos que se conectassem com isso. O André [Gonzales, vocalista e designer] cuidava das artes, e tínhamos fornecedores fixos para itens como camisetas com frases e até bottons”, descreve.

Peça publicitária anunciando roupas do Móveis Coloniais de Acaju. Reprodução

A gestão do estoque e da contabilidade também era feita pela própria banda, com a ajuda de um funcionário exclusivo para isso, o que ilustra como o merchandising pode ser uma fonte importante de receita para artistas independentes. 

Para o Móveis, era ainda mais importante — afinal, eram nove músicos. Segundo Nogueira, a receita gerada pela venda de produtos era comparável ao cachê da banda e, em alguns casos, representava a totalidade do lucro da viagem.

“Em vários shows, era um complemento fundamental, porque sempre foi muita gente, e sempre foi caro viajar”, recorda.

De lá para cá, pouca coisa mudou, embora tenha ficado cada vez mais fácil montar um e-commerce, despachar encomendas, ter uma máquina de cartão e receber em Pix. Porém, o relatório da MIDiA contextualizou que, embora o vinil e outros produtos físicos tenham uma base de fãs fiel, o mercado precisa de inovação para continuar atraindo compradores. As gravadoras que não adaptarem suas estratégias podem ver uma redução no engajamento. Produtos interativos e digitais podem ser a resposta para essa nova fase.

DESAFIOS E ESTRATÉGIAS

Embora seja um dos principais mercados musicais do mundo, o cenário brasileiro de merchandising ainda enfrenta obstáculos. Baggio, da House Brands, comenta sobre as dificuldades de expandir as operações de venda de produtos em todo o território.

“Um dos maiores desafios do mercado de merchandising no Brasil está na logística. Um outro desafio é encontrar uma empresa capaz de promover uma operação de vendas a nível nacional, contando com colaboradores pelos quatro cantos do país”, explica. 

Por outro lado, ele vê uma resposta muito positiva dos fãs em relação aos produtos oficiais, especialmente quando a imagem do artista está em destaque.

“A resistência à compra é mínima, com muitos fãs já chegando ao evento com a intenção de adquirir um item oficial. Uma presença mais forte no digital pode ajudar a expandir esse mercado, alcançando fãs que não estão fisicamente nos eventos e proporcionando uma experiência mais completa”, destaca.

Isso ajudaria a diminuir o gargalo dos produtos vendidos sem licença.

“Uma forma de atrair mais fãs para os canais oficiais é dar visibilidade à lojinha oficial dentro dos eventos, utilizando marketing direcionado para mostrar que é lá que estão os produtos licenciados. Além disso, quando o artista usa os seus próprios produtos, isso cria uma conexão mais forte com os fãs, gerando mais desejo de adquirir os itens oficiais. Embora muitos fãs já percebam a diferença entre produtos oficiais e não oficiais, sabemos que ainda há espaço para melhorar essa conscientização”, pontua.

UMA VISITA QUE MUDOU TUDO

Esdras Nogueira relembra o momento em que o próprio Móveis se tornou uma fonte de produtos “não-oficiais” como parte de uma estratégia para fazer a música circular. A banda adotava uma abordagem prática para distribuir CDs a preços simbólicos:

“A gente prensava esses CDs no nosso escritório e distribuía ou vendia por 5 reais. Então a gente se autopirateava, mas enxergava isso como potencial de divulgação. Tudo deu muito certo.”

A experiência de visitar a casa do pai dos líderes d'O Teatro Mágico, Fernando e Gustavo Anitelli, trouxe uma nova perspectiva sobre o potencial de produção própria, já que o pai dos integrantes desse famoso grupo paulista cuidava pessoalmente da produção do merchandising.

“A gente conheceu o Seu Odácio e ele é quem cuidava de tudo do merch d'O Teatro Mágico. Fomos à casa dele e falamos: a gente tem que fazer isso também”, conta Esdras.

Almofada d'O Teatro Mágico: variedade na lojinha. Reprodução

SUSTENTABILIDADE COMO PILAR

O relatório da MIDiA Research aponta para a necessidade de inovação no mercado de merchandising. A House Brands acredita em dois caminhos possíveis para isso.

“A tecnologia tem um papel fundamental como uma segunda fonte de escoamento para os produtos. O que realmente faz a diferença é a combinação de várias ferramentas que tornam a experiência do fã mais imersiva e prática. Outro ponto importante é a personalização dos produtos. Os fãs não compram apenas um item, eles compram um pedaço da história do artista, uma lembrança do momento único vivido no show. O merchandising no evento tem esse papel emocional que os produtos vendidos online muitas vezes não conseguem reproduzir”, analisa.

A sustentabilidade também aparece como um elemento central. Produtos que têm um apelo sustentável, como os copos reutilizáveis, campeões de venda em qualquer evento, são uma forma de os fãs apoiarem iniciativas que vão além do consumo imediato.

“Ao comprar um desses copos, o fã está deixando de usar vários descartáveis, o que impacta positivamente o meio ambiente. Essa é uma forma de unir o consumo do fã com a conscientização ambiental, criando um ciclo de consumo mais sustentável e responsável”, observa Baggio.

 

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