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Por que a futura lei de IA britânica está sendo criticada por McCartney e Elton John
Publicado em 29/01/2025

Estrelas do pop se posicionam contra plano do governo Starmer que pode prejudicar a indústria criativa do país

Por Eduardo Lemos Martin, de Bath, Inglaterra

Elton John e Paul McCartney. Montagem com fotos da Shutterstock

O livre uso de material protegido por direitos autorais para treinar modelos de IA é o assunto de uma consulta pública lançada pelo governo britânico de cara a um novo projeto de lei. E levou dois dos maiores artistas pop da história a se manifestarem esta semana. Primeiro foi Paul McCartney: em entrevista à BBC no sábado passado (25), o ex-beatle se mostrou preocupado com a possibilidade de artistas serem “roubados” se a futura lei de IA do país tirar dos criadores o direito de autorizar ou não o uso de suas obras - e ser remunerados por isso.

“Você tem rapazes, moças, surgindo, e eles escrevem uma música linda, e eles não têm direitos sobre ela. Qualquer um que queira pode simplesmente roubá-la. A verdade é que o dinheiro está indo para algum lugar... Alguém está sendo pago, então por que não deveria ser o cara que se sentou e escreveu ‘Yesterday’?", disse o músico.

Na segunda-feira (27), foi a vez de Elton John, outra entidade da música britânica, vir a público criticar a lei. Para o criador de “Rocket Man” e “Your Song”, um retrocesso na proteção aos direitos autorais prejudicaria “os meios de subsistência dos artistas”. 

“(A lei) vai permitir que as grandes empresas globais de tecnologia tenham acesso fácil e gratuito ao trabalho dos artistas para treinar sua inteligência artificial e criar músicas concorrentes. Diluirá e ameaçará ainda mais os ganhos dos jovens artistas. A comunidade de músicos rejeita isso de todo o coração", comentou o músico em entrevista ao jornal Sunday Times.

Afinal, o que está em discussão na nova lei?

Atualmente, o governo do Reino Unido considera alterar as leis de direitos autorais para permitir que desenvolvedores de modelos de IA usem todo e qualquer conteúdo disponível na internet, gratuitamente, para o desenvolvimento de seus modelos. A consulta pública sobre o tema vai até 25 de fevereiro e, oficialmente, busca entender como melhorar a confiança entre os setores criativo e de IA, e como os criadores podem licenciar e receber pelo uso de seu material.

Uma das mudanças propostas pelo governo, atualmente comandando pelo Partido Trabalhista (centro-esquerda) do primeiro-ministro Keir Starmer, coloca sobre os artistas o ônus de monitorar e notificar os múltiplos desenvolvedores de tecnologia para que não usem seus trabalhos. Ou seja, quem não se manifestar estaria automaticamente dando permissão às empresas. 

A proposta foi criticada por muitos profissionais do setor criativo. Para eles, seria impossível a um determinado compositor notificar os diferentes provedores de serviços de IA ou monitorar o que aconteceu com seu trabalho em toda a internet. 

A discussão sobre privilegiar a atuação das empresas de IA em detrimento da proteção de criadores faz parte de um novo e ambicioso plano do Reino Unido para tornar o país um dos "mais inovadores" em matéria de inteligência artificial em áreas como edução e cultura. As possíveis novas medidas, como esperado, vêm sendo elogiadas por líderes dos setores de tecnologia e negócios. 

Na área criativa, entre as muitas iniciativas de um Plano de Ação de Oportunidades de IA com 50 pontos apresentado ao Parlamento este mês, está um compromisso de reformar o regime de mineração de texto e dados do Reino Unido para ser "pelo menos tão competitivo" quanto o da União Europeia. Ironicamente, a UE, em seu marco regulatório sobre o tema, aprovado em março do ano passado, manifesta claramente o perigo da mineração de obras criativas sem autorização para o treinamento dos sistemas de IA generativa.

"A atual incerteza em torno da propriedade intelectual está dificultando a inovação e minando nossas ambições mais amplas para IA, bem como o crescimento de nossas indústrias criativas", diz um trecho do plano britânico.

Um porta-voz do governo disse:

"Nosso objetivo é fornecer segurança jurídica por meio de um regime de direitos autorais que forneça aos criadores controle real e transparência, e que os ajude a licenciar seu conteúdo. Estamos ansiosos para ouvir as opiniões da indústria musical sobre essas propostas, e nenhuma ação será tomada até que estejamos absolutamente confiantes de que estamos fornecendo clareza, controle e transparência aos artistas e ao setor, juntamente com acesso apropriado aos dados para inovadores de IA."

Cresce o movimento de artistas contra a IA 

As manifestações de Paul McCartney e Elton John estão por toda a mídia britânica e devem ajudar a chamar mais a atenção para os riscos que profissionais criativos correm se os governos aprovarem leis permissivas em relação à IA.

“Sem uma proteção de direitos autorais completa e robusta que permita aos artistas ganhar o dinheiro arduamente conquistado com a sua música, o futuro lugar do Reino Unido no cenário mundial como líder em artes e cultura popular está sob sério risco", defendeu Elton John. 

Paul McCartney e Elton John se juntam a um número cada vez maior de artistas a lamentar a ascensão da inteligência artificial e os danos que ela pode causar às indústrias criativas. Em abril de 2024, um grupo de mais de 200 artistas de renome internacional assinou uma carta aberta pedindo proteções contra o uso predatório de inteligência artificial que imita a aparência, as vozes e o som de artistas humanos.

Os signatários tinham desde estrelas do pop mundial, como Billie Eilish, J Balvin e Nicki Minaj, até membros do Hall da Fama do Rock and Roll como Stevie Wonder e o grupo REM. Os espólios de Frank Sinatra e Bob Marley também assinaram o manifesto, organizado pelo grupo Artist Rights Alliance (aliança pelos direitos dos artistas). A demanda do grupo era simples: que as empresas de tecnologia se comprometam a não desenvolver ferramentas de IA que prejudiquem ou substituam compositores e artistas humanos.

Os próximos passos deste novo projeto de lei britânico não estão ferreamente definidos. Apresentado originalmente no Parlamento em outubro de 2024, ele teria seu período de consultas finalizado agora em janeiro, mas já foi prorrogado para 25 de fevereiro - e não se descartam novas mudanças de cronograma, dada a enorme repercussão do tema. Finalizadas as consultas, seguirá tramitação parlamentar e deverá ser votado ainda este ano. Caso seja aprovado, suas principais disposições provavelmente entrarão em vigor no início de 2026.

 

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