Instagram Feed

ubcmusica

No

cias

Notícias

‘Muito Estranho’: sucesso de Dalto avança para as novas gerações
Publicado em 07/02/2025

Falamos com o cantor e compositor sobre criação e seu maior clássico, que volta a ganhar impulso — e likes — nas redes

Por Chris Fuscaldo, do Rio

Faz 43 anos que “Muito Estranho” (Dalto e Cláudio Rabello) estourou nas paradas de sucesso, fazendo com que seu coautor e intérprete, Dalto, finalmente largasse seu trabalho como anestesista em um hospital da cidade de Niterói (RJ). Aos 33 anos, o músico já tinha emplacado “Flash-Back” (Dalto, Cláudio Rabello e Ralph Guedes, 1974) nas rádios e visto a sua “Bem-Te-Vi” ser gravada por Renato Terra em 1980. Porém, foi com a faixa do LP de 1982 que ele se sentiu seguro para abandonar a medicina.

Hoje, 43 anos depois, já bateu recorde de visualizações no perfil de Raul Ruffo (um milhão de views) no Instagram um vídeo em que o músico e jornalista espalha para a nova geração que “Muito Estranho” é a música brasileira que ficou mais tempo sem sair do primeiro lugar nas paradas de sucesso na história: pouco mais de um ano.

“Além de primeira entre as mais executadas, a música fez com que o álbum (homônimo) ficasse em primeiro lugar em vendas: na época, mais de um milhão e meio de cópias. Hoje, se não me engano já chegou a 5 milhões. Eu soube disso através de um livro do Ricardo Cravo Albin (‘MPB: A História de um Século’, 1997) e um do Zuza Homem de Mello (A Canção no Tempo’, em coautoria com Jairo Severiano, 1997-1998)”, conta Dalto à UBC. “É claro que eu sabia que minhas músicas estavam fazendo sucesso. Quando ia viajar para fazer shows pelo Brasil, em todos os lugares as pessoas sabiam todas as letras. Mas ‘Muito Estranho’ foi uma coisa muito estranha, meio acima do normal, passou dos limites. Aqui no Rio ela tocava em todas as rádios, em emissoras de diferentes segmentos. E nem as outras que fui lançando depois a tiravam do topo das paradas.”

VEJA MAIS: Dalto numa apresentação de "Muito Estranho" nos anos 1980

Sem estrelismos e sem muito investimento de marketing, Dalto e seu violão foram emplacando sucesso atrás de sucesso depois de “Muito Estranho”, sem tirar o reinado dessa canção, que no futuro seria regravada por Martinha (em 1986), por Roberta Miranda (em 1997), por Simone (em 2001), por Nando Reis (em 2010) e por Toni Garrido (em 2014), entre outros.

O álbum seguinte, “Pessoa”, reúne canções que também alcançaram o topo das listas com sua voz e que, anos depois, foram gravadas por grandes nomes da música brasileira: a faixa-título, por Marina (em 1993); “Espelhos d’água”, por Patrícia Marx (em 1994), Beto Guedes (em 1999), Preta Gil (em 2003) e Frank Aguiar (em 2007); “Anjo”, pelo Roupa Nova (em 1983). Todas em parceria com Cláudio Rabello, e a última ainda com Renato Corrêa. No disco de 1988, “Um Coração em Mil”, tem uma composição de Dalto com Byafra, “Leão Ferido”, que estourou na voz desse outro niteroiense em 1981.

Aos 75, Dalto celebra um feito que, definitivamente, não aconteceu com sua ajuda:

“Eu nunca liguei para nada. Nunca soube quantos discos eu vendia. Eu queria ver as pessoas cantando, só isso”, conta Dalto.

SEM CONCESSÕES

O músico niteroiense não só não liga para nada (até hoje) como não facilitou para o mercado, muito viciado naquela época. Primeiro, entendia a música como um hobby e a medicina como seu ofício. Depois de aparecer através de participações em bandas como Os Lobos e de emplacar “Flash-Back” através de um compacto simples, começou a gravar seus próprios discos, mas não aceitou pitacos de executivos de gravadora em suas gravações. Um dia, ao chegar à TV Globo para filmar um clipe para o Fantástico, negou-se a vestir um figurino estilo andrógino que o diretor separou para ele e acabou vetado da emissora por anos.

“Eu agradeço a Deus, porque Ele me deixa ser assim do jeito que eu sou, não corta a minha onda. Aliás, acho que curte a minha onda, só pode ser. Eu nunca estou dentro da regra, e vai dando certo. Estou com 75 anos e me emociono até hoje nos shows. Nem preciso mais cantar: dou a primeira frase, e vai lá, Brasil... Viro o microfone para a plateia, e é uma loucura. Eu não quero me meter nessa viagem de like. Eu não preciso de like pra viver, mas claro que adorei saber desse vídeo que está rolando por aí. Era uma informação que eu tinha, mas não usava a meu favor.”

Posando dentro do Teatro Municipal de Niterói (RJ). Foto: arquivo pessoal

 

“Deus” é tão bom para Dalto que “Muito Estranho” voltou ao topo das paradas – no caso, da lista de vídeos mais vistos no perfil do Raul Ruffo no Instagram – mas, agora, conquistando uma nova geração de fãs. Aos 32 anos, o cantor, compositor e jornalista nascido no Paraná, criado no Mato Grosso e habitante do Mato Grosso do Sul, ouvia as músicas de Dalto nas rádios das cidades por onde passou. Na única emissora de Alto Taquari (MT), a Rádio Nascente, tocava bastante.

“Dalto faz mais parte do repertório que meus pais ouviam e, por isso, faz parte da minha memória afetiva. Eu comecei tocando com meus pais na Igreja e sempre os ouvia cantando Dalto no karaokê. ‘Muito Estranho’, ‘Bem-Te-Vi’, ‘Anjo’... Só que eu não sabia que todas essas músicas eram dele. Através das pesquisas que fiz para falar de ‘Muito Estranho’ é que me surpreendi com a história fascinante que descobri. Dalto foi compositor, se formou médico, voltou para a música e teve um sucesso imenso. Nos meus vídeos, busco fazer essa relação da vida com a obra para furar a bolha não falando só de música. Acho que, para além dos fãs de música, atingi um pessoal da medicina também”, comenta Raul.

Jornalista com passagens pela TV Morena (afiliada da Globo em Mato Grosso do Sul) e cantor que já passou pelo palco de Raul Gil e chegou a gravar discos, Ruffo aprende diariamente ao mergulhar nessas pesquisas e relembrar as referências de sua infância. Canções escritas por Dalto, por exemplo, também passaram pelas propagandas das coletâneas da gravadora Som Livre que eram transmitidas pela televisão nos anos 1980 e 1990. Em fevereiro em 2024, Raul começou a colocar curiosidades para fora:

“Eu sempre gostei de postar música, eu cantando e tocando. Mas percebi que o pessoal estava carente de conteúdo. Fui postando e encontrei um nicho ao misturar meu trabalho como intérprete ao de jornalista que apura a história. Chego a usar 15 fontes em um vídeo. A primeira rede que deu certo foi o TikTok. Fiz uma música do Tim Maia, “Você”, e a galera só conhecia o refrão (“Você é algo assim, é tudo pra mim...”). Deu muitas visualizações. Aí fui levando para o Instagram e para o YouTube. Tem muita gente da nova geração que conhece as músicas, mas não as histórias.”

Para completar a história contada por Raul no vídeo de menos de dois minutos, “Muito Estranho” foi composta por Dalto e Cláudio Rabello à distância, como a dupla sempre gostou de fazer. No entanto, o arranjo foi iniciado em Niterói, em um dia em que Dalto levou Eduardo Souto Neto (para quem não conhece, ele também é autor da música do Rock in Rio) à casa do engenheiro e músico Cornélio de Souza Melo para usar o piano do amigo de infância. Os dois já tinham tomado uns goles e chegaram tarde lá, mas empolgados com o sucesso que estava por vir.

Logo que chegou à gravadora Odeon com a música, o diretor artístico convidou uma turma de radialistas para uma reunião e pediu para o músico tocar.

“Eu toquei a música cinco vezes seguidas. Foi um sucesso entre eles, assim como tinha sido na casa do meu amigo quando estávamos bolando o arranjo. Não adianta: existe uma parceria entre a música e o ouvinte que tem que acontecer para que ela dê certo. Eu, como artista, estou ali só carregando o instrumento”, reflete Dalto, que canta as suas músicas nos shows no mesmo tom que cantava quando as gravou.

“Muito Estranho” ainda ganhará uma versão ao vivo em breve, quando for lançado o audiovisual gravado em 2024 no Teatro Municipal de Niterói com todos os seus sucessos no repertório. E Dalto avisa que, além desse trabalho de celebração de sua carreira, lançará também um álbum de inéditas.

“Espero que as pessoas gostem”, diz.

 

LEIA MAIS: Um papo com Marcos Sabino, parceiro de Dalto em canções

LEIA MAIS: Como é a série sobre Sullivan e Massadas do Globoplay

LEIA MAIS: A fórmula que fez do TikTok um dos grandes trampolins para músicas antigas voltarem


 

 



Voltar