Produtor e músico dão dicas de como trilhar esse circuito. Lista reúne eventos das cinco regiões do Brasil; confira
Por Nathália Pandeló, do Rio
O cenário dos festivais alternativos no Brasil cresce tanto que já desafia o próprio rótulo de “alternativos”. Em 2024, o conjunto dos eventos no país movimentou R$ 314,2 bilhões, com os festivais de música ocupando um espaço considerável, segundo dados do setor. E surpreende-se quem só há espaço para pesos-pesados como Rock in Rio, Lollapalooza Brasil, The Town e outros do tipo. Um circuito paralelo, vibrante e cada vez mais concorrido tem se consolidado como uma plataforma importante para novos talentos.
A inserção nesses festivais, no entanto, exige mais do que apenas um som original. Artistas que buscam espaço nesses palcos precisam entender os critérios de seleção das curadorias e construir uma rede de contatos consistente. A experiência de músicos que já passaram pelo circuito mostra que presença ativa na cena, material bem elaborado e uma boa estratégia de networking são chaves que realmente abrem portas.
PRIMEIROS PASSOS
Victor Meira, cantor e compositor da banda paulistana Bratislava, relembra os desafios iniciais.
"Participamos de um punhado de festivais desses em que as bandas têm que vender uma cota de ingressos. E eram festivais bem ruins, sem infra, mal produzidos", conta.
A primeira grande oportunidade da banda veio em 2012, no Rio Harley Days, mas foi apenas em 2014, no Conexão BH, que a Bratislava viveu uma experiência marcante:
"Tocamos num horário bom, para um bom público. Estávamos no quarto ano de banda, foi uma experiência bem marcante, um dos shows mais legais que fizemos.”
Victor Meira (o primeiro à esquerda, em pé) e os companheiros da Bratislava. Foto: Laís Lima
A partir dali, foram três anos até chegar ao maior palco já ocupado pela Bratislava: o Lollapalooza Brasil. Em 2017, a banda passou ainda pelo CoMA, em Brasília. O ano seguinte seguiu o mesmo padrão: Ponto.CE (CE), DoSol (RN) e o extinto Bananada (GO), expandindo o foco de atuação para além do Sudeste.
O contato com as curadorias, segundo Meira, acontecia de forma orgânica.
"Às vezes pintava por indicação de bandas amigas, às vezes você conhecia os curadores assistindo a shows de outras bandas, às vezes pelas redes sociais. Era participando da cena e sendo ativo que essas oportunidades surgiam", explica.
O QUE BUSCAM OS PRODUTORES
Embora os festivais alternativos ofereçam um espaço para artistas fora do mainstream, isso não significa que os critérios de relevância sejam ignorados. Assim como nos grandes eventos, a capacidade de atrair público e movimentar ingressos ainda é um fator determinante para a seleção de bandas.
Métricas como números de seguidores nas redes sociais, desempenho em plataformas de streaming e engajamento digital pesam, mesmo que em menor escala. Para os curadores, apostar em um artista que já demonstra um crescimento consistente pode ser uma decisão mais segura, garantindo que o festival tenha um público interessado e uma estrutura sustentável.
A forma como os artistas se apresentam para as curadorias também evoluiu ao longo dos anos. Victor Meira explica que, no início da carreira da Bratislava, o processo era diferente.
"Lá no começo dos anos 10, a gente enviava um PDF com o release e fotos da banda. Isso é arcaico hoje", comenta o artista, explicando que a banda passou a adotar uma abordagem mais dinâmica: "Depois de um tempo, passamos a mandar um link no Google Slides, que permitia que a gente sempre estivesse atualizando o conteúdo e também dava pra deixar links. Até hoje continuo achando a forma mais prática. E claro, caprichar bastante nesse conteúdo, mantendo o mais simples e direto possível, e tendo um carinho no design também. O papel, mais do que informar, é encantar."
Carlo Bruno Montalvão, diretor da Brain Productions Booking, empresário musical, produtor artístico e booker internacional com mais de 25 anos de experiência, ressalta que “as vagas são poucas e restritas para novos artistas, mas isso não quer dizer que é impossível para eles encontrar uma oportunidade.” Ele sugere que os músicos participem de feiras de música, fiquem atentos a editais e construam uma rede de contatos sólida:
“Tenha uma boa equipe de trabalho, principalmente uma assessoria de imprensa que o ajude a comunicar sua arte, além de um agente ou booker que consiga vender seus shows para os curadores e produtores.”
Carlo Bruno Montalvão. Foto: arquivo pessoal
Ele lembra ainda que ser aprovado para o line-up de um evento não é, necessariamente, o fim dos problemas. Às vezes, o cachê oferecido pode não cobrir os custos de deslocamento de uma banda inteira, incluindo equipe técnica e logística. Isso faz com que muitos artistas precisem buscar alternativas para viabilizar a participação, transformando a oportunidade em algo sustentável.
"Se você recebe um convite para um festival no Nordeste, por exemplo, pode entrar em contato com produtores locais e tentar marcar shows antes ou depois do evento", explica Montalvão. "Fazer uma turnê em conjunto com outra banda pode otimizar custos e aumentar o alcance.”
O IMPONDERÁVEL
Victor Meira, da Bratislava, recorda que o sucesso no circuito alternativo depende de uma combinação de fatores e reforça que até a sorte influencia:
"As coisas acontecem em parte por conta de competência, música boa, trabalho bem feito. Mas tem um caminhão de SORTE em tudo isso. Tem banda ruim que tem sorte. Banda boa que não tem. Banda boa que tem. Tem banda ruim que aproveita o sopro de sorte e vira uma banda boa. Tem de tudo.”
Com tantas variáveis, só há uma coisa que o artista consegue, de fato, controlar:
“Fazer o seu melhor e curtir muito cada parte do processo. Porque se, mesmo fazendo tudo isso, você não conseguir descolar grandes palcos ou festivais, pelo menos curtiu viver a parada, fez música boa e que te orgulha. E o sucesso sempre vai ser relativo: você vai se achar um fracassado se comparando com as bandas que você admira, mas pode ter certeza de que tem dezenas de bandas que gostariam de estar no seu lugar, que consideram a sua história um sucesso”, resume Meira.
Para tentar a sorte nesse mundo, listamos 28 festivais das cinco regiões do Brasil que abrem espaço para artistas independentes. Também deixamos os contatos para falar com curadores/produtores. Planeje-se e boa sorte!
NORTE
Artistas durante show no Até o Tucupi, em Manaus. Foto: divulgação
NORDESTE
Momento de uma edição do Radioca, em Salvador. Foto: Divulgação/Rafael Passos
CENTRO-OESTE
Público durante show do Vaca Amarela, em Goiânia. Foto: divulgação
SUDESTE
Público lota edição do João Rock, em Ribeirão Preto (SP). Divulgação
SUL
Momento de uma edição do Tum Festival, em Florianópolis. Reprodução internet
Itinerante
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