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Universal lança streaming de música clássica e aquece tendência global
Publicado em 01/12/2022

STAGE+ se soma a Idagio e Primephonic; Spotify e Tidal investem em alta definição para melhorar experiência de audição

Por Ricardo Silva, de São Paulo

A Universal Music acaba de lançar a STAGE+, sua própria plataforma de streaming especializada em música clássica. Através do seu selo Deutsche Grammophon – que nasceu há 124 anos, foi adquirido pela Universal há 13 e alega ser o mais antigo do mundo em atividade –, a major nº1 reforça um movimento de mercado que nem de longe é isolado.

Apple Inc. – com a Primephonic –; além de Qobuz, Tidal, Amazon e Spotify, todas elas envolvidas em grandes investimentos na tecnologia de alta definição sonora visando à música clássica, também dão gás à tendência. A razão é bem simples. Um estudo da Billboard em parceria com a consultoria Nielsen estabeleceu o quinhão da música clássica em 1% do mercado global, tanto em receitas totais como em direitos autorais distribuídos. 

Isto significa que o gênero rendeu cerca de US$ 260 milhões mundialmente ano passado, com base no total registrado pelo mais recente relatório da IFPI, a Federação Internacional da Indústria Fonográfica. Já a soma em direitos distribuídos seria da ordem de US$ 84 milhões, se levarmos em conta os valores apurados em 2021 pela Cisac, a Confederação das Sociedades de Autores e Compositores.

Mas outro dado é considerado ainda mais positivo pelo mercado porque é promissor e mostra que, diferentemente do que sugerem os clichês, música clássica não é coisa só de públicos mais velhos. Um levantamento da plataforma Deezer, em parceria com a Royal Philharmonic Orchestra e a sociedade de gestão coletiva britânica BPI, revelou que, em 2020, auge da pandemia, o consumo de música de concerto por menores de 35 anos disparou 17%, em média, em relação ao ano anterior. Durante o período mais duro do confinamento, a alta foi ainda mais acentuada. 

“Há um enorme apetite por bom conteúdo de música clássica online, em todos os públicos”, disse Frank Briegmann, presidente da Universal Music Central Europe e também da Deutsche Grammophon, mencionando este momento de auge da chamada “música curativa”, instrumental, com pegada de relaxamento e contemplação, como já mostramos em reportagens anteriores aqui no site da UBC. 

O grande pulo do gato, para Briegmann e outros que oferecem um amplo e completo catálogo clássico, é fazê-lo em alta definição:

“O STAGE+ quer transformar o espaço para a música clássica online. Além da alta resolução, os investimentos em metadados otimizados permitirão aos fãs da música clássica fazer buscas pelo título, acessando trabalhos individuais dos artistas, movimentos ou cenas de óperas", ele elencou.

Isso porque a nova plataforma, além de música, também abriga um extenso conjunto de vídeos e fará ainda pré-estreias exclusivas para os assinantes, além de transmitir apresentações ao vivo direto dos grandes templos da música clássica mundial. Numa sociedade crescentemente visual, portanto, não teria sentido oferecer apenas áudio.

Com pequenas diferenças, serviços como o Primephonic, da Apple, e a Idagio, talvez a mais conhecida e respeitada plataforma de streaming dedicada exclusivamente à música clássica, já oferecem essas funcionalidades. Segundo a Idagio, 30% dos assinantes em 2019 tinham menos de 35 anos, o que não é pouco. Talvez o sucesso dessas plataformas especializadas tenha uma explicação: os grandes apps de streaming ainda não entenderam a real dimensão deste gênero e não o privilegiam na sua navegação.

"O sistema de metadados de Spotify e similares não é apropriado para a música clássica. Os CDs da orquestra ficam meio perdidos lá dentro”, disse à UBC Marcelo Lopes, diretor-executivo da Osesp, mais importante orquestra brasileira e que, em outubro, fez história, tornando-se a primeira do nosso país a se apresentar numa temporada internacional do prestigioso Carnegie Hall de Nova York neste século.

No programa, entre outras, o “Concerto Para Harmônica, op. 86”, o “Prelúdio da Bachiana nº4” e o “Choro nº 10 – Rasga o Coração”, todas obras de Heitor Villa-Lobos (com, nesta última, letra de Catulo da Paixão Cearense). Villa-Lobos, o enorme compositor nascido há 135 anos no Rio de Janeiro, morto há 63 e autor de mais de duas mil obras clássicas, é um dos nomes brasileiros mais conhecidos do gênero em nível mundial. E, sem dúvida, um grande ponto de contato das novas gerações com a música de concerto.

E os direitos autorais?

A questão do pagamento de direitos autorais, como já discutimos numa reportagem sobre música clássica publicada antes da pandemia, permanece como um ponto a melhorar (e muito) em meio a esse grande momento da proliferação das plataformas especializadas. Marisa Gandelman, ex-diretora-executiva da UBC, advogada e educadora especializada em direitos autorais, além de representante da obra de Villa-Lobos, definiu bem o problema na ocasião: 

"Precisa haver uma regra de negócios mais transparente. Eu recebo uma prestação de contas com 300 linhas de streaming que dão US$ 4, enquanto uma linha de aluguel de partituras dá US$ 1.300. Qual é o critério para o cálculo dessa remuneração?”

Os preços das assinaturas desses serviços especializados não são exatamente baratos - pelo menos não se considerarmos o valor internacional de US$ 9,99 do Spotify, por exemplo. A STAGE+ tem pacotes que começam em € 14,90 mensais (algo como R$ 82 reais, pelo câmbio desta quarta-feira, 30). A Qobuz, que não é exclusivamente de música de concerto mas tem no gênero uma parte importante do seu catálogo, começa com € 12,50 (R$ 68), sempre com alta resolução de áudio. Já o plano premium da Idagio sem perda de qualidade de áudio mais em conta sai por € 12,99 (R$ 71). Isto torna difícil para as plataformas sustentar uma política de pagamentos aquém do justo. 

A Idagio alega pagar melhor que as demais, aplicando o modelo user-centric, ou seja, tendo em conta o tempo efetivo de audição de cada usuário para fazer a distribuição entre as partes - o que, em peças de, às vezes, mais de 30 minutos faz todo o sentido. Mas nisso está sozinha, já que as grandes plataformas mainstream (Spotify, Apple, Amazon) ainda continuam a aplicar o modelo market-centric, no qual o bolo gerado em direitos é distribuído ao conjunto dos titulares, beneficiando os que tiveram maior quantidade de streams e, claro, tornando bem menores os valores de um gênero de nicho como a música clássica. Não foi divulgado o modelo a ser usado pela STAGE+.

Resta, portanto, saber como será a política de pagamentos da nova plataforma e das outras que se propõem a explorar um meio multimilionário e com reais possibilidades de grande expansão nos próximos anos, mas que ainda tem como tarefa pendente remunerar justamente os intérpretes e outros titulares das músicas.

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