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Como Spotify, Amazon e TikTok abordam questão da música gerada por IA
Publicado em 04/05/2023

Um resumo das ações e do discurso de grandes plataformas digitais sobre uma tecnologia que gera tudo, menos consensos

Por Alessandro Soler, de Estocolmo

A criação de canções por inteligência artificial (IA) — longe se ser uma hipótese futura, uma realidade bem presente que assusta muitos players do mercado — é um tema que gera de tudo, menos consensos. Vista pelo streaming, num primeiro momento, como uma possibilidade de despejar no sistema milhares de músicas sem copyright (ou com copyright das próprias plataformas), trazendo mais lucros a essas empresas, agora a IA vai ganhando contornos de vilã a combater. Pelo menos no discurso público de gigantes do setor.

Nos últimos dias, acumulam-se notícias sobre ações de apps como Spotify, Deezer e TIDAL contra as ferramentas que varrem livremente seus sistemas em busca de pedacinhos de músicas para, depois, gerar “novas” músicas. Algumas das plataformas têm ido além e derrubado playlists e faixas individuais criadas por IA. Por trás disso está a reclamação cada vez mais ruidosa de gravadoras, editoras, compositores e intérpretes sobre as violações dos seus direitos pelos programas de geração por robôs.

Há algumas semanas, o tema chegou ao mainstream, quando o rapper americano Drake, o cantor pop canadense The Weeknd e a Universal Music denunciaram a música viral “Heart on My Sleeve”, subida a plataformas como Spotify, Apple Music e YouTube. Na alegação dos compositores e da gravadora, a música, que usou inteligência artificial para copiar o estilo dos artistas e imitar perfeitamente os vocais deles, infringiu seus direitos autorais.

"O recente desenvolvimento explosivo em IA generativa, se não for controlado, aumentará o fluxo de conteúdo indesejado hospedado em plataformas de streaming e criará problemas com as leis de proteção de direitos autorais no mundo todo. É preciso agir, e agir já”, disse Lucian Grainge, presidente mundial da Universal, companhia que está empreendendo uma verdadeira guerra contra o uso de canções do seu catálogo para gerar outras artificialmente.

A reclamação foi um ponto de mudança para algumas plataformas de streaming, que não só derrubaram a faixa como anunciaram mecanismos para bloquear novos uploads semelhantes. Reunimos aqui as políticas atuais para a IA em diferentes big techs da música. Um retrato momentâneo e provisório, já que, como ocorre com qualquer nova tecnologia disruptiva, esta é uma narrativa em plena construção. 

Spotify

Em fevereiro, a maior plataforma do mundo lançou seu serviço AI DJ, que permite a criação de músicas por inteligência artificial a partir da interação com o usuário. Somem-se a isso as denúncias crescentes da indústria sobre as misteriosas faixas de 30 segundos (criadas, em grande parte, por IA, e que pertenceriam ao próprio Spotify) para nos dar uma boa ideia da opinião da empresa de Daniel Ek sobre a nova tecnologia.

Tudo mudou com o caso Drake. Nas últimas semanas, o Spotify bloqueou em massa novos uploads de uma das principais plataformas mundiais de geração de música por inteligência artificial, a Boomy — que, com 14 milhões de músicas geradas, diz ter quase 14% do catálogo mundial da música gravada. E, durante a recente divulgação do seu balanço do primeiro trimestre, o diretor-executivo da gigante sueca garantiu que combaterá a mineração de obras protegidas por ferramentas de criação automática de músicas. 

“Uma coisa é (o nosso serviço) AI DJ, que só teve elogios da indústria. Outra são as questões sobre o uso (por robôs) de nomes de artistas reais ou da semelhança estética com eles, temas que preocupam a indústria e que são legítimos. Estamos trabalhando em parceria com gravadoras para estabelecer uma posição na qual permitamos a inovação ao mesmo tempo em que protegemos os criadores”, ele disse. "Para a saúde de todo o ecossistema musical, é importante deixar claro a quem pertence os direitos e se é justo atribuir valor (a uma faixa criada por IA) usando o nome e o estilo de outros."

Deezer, Tidal

As duas plataformas também têm trabalhado em formas de bloquear uploads massivos de canções geradas por IA e, por pressão das gravadoras, impedir a mineração dos seus sistemas. Num comunicado obtido pela UBC, o diretor-executivo da Deezer, Jeronimo Folgueira, disse defender um endurecimento contra a varredura de dados musicais sem autorização e contra a publicação de músicas que emulem artistas conhecidos e usem seus nomes: 

“Apoio a ideia de sermos mais estritos em relação ao que permitimos que seja publicado na plataforma e à qualidade do catálogo. Especialmente agora que a música gerada por robôs decola, acho que precisamos abordar bem essa questão. E estamos fazendo isso junto aos selos e gravadoras.”

Já o TIDAL (que acaba de fechar um acordo com o Ecad para o pagamento de execução pública no Brasil) foi um dos primeiros em derrubar a canção fake de Drake e The Weeknd após a queixa dos artistas e da Universal Music. Sem mencionar diretamente a música criada por inteligência artificial, a plataforma — que tem Jay Z e Beyoncé entre seus sócios e sempre se gabou de proteger os compositores — relançou esta semana seu programa TIDAL Rising, para estimular o surgimento de novos talentos “humanos”. 

Amazon Music 

Aparentemente na contramão das principais competidoras, a Amazon não tem publicado declarações alertando para os perigos da mineração de músicas ou do uso indiscriminado de inteligência artificial para a criação. No final de fevereiro, por outro lado, a plataforma anunciou uma colaboração com a empresa de inteligência artificial Endel para produzir playlists com canções de “bem-estar” a serem adicionadas ao seu catálogo. 

Sediada em Berlim, a Endel diz ser uma empresa criada com a colaboração de “artistas” e programadores para gerar listas personalizadas que ajudem o usuário a “focar”, “relaxar” ou “dormir”. Ela admite usar dados rastreados dos movimentos do próprio usuário ao longo do dia, como a hora em que ele se levantou, quantos quilômetros andou ou sua localização, cruzados com a previsão do tempo e outros fatores para oferecer as playlists por horário ou atividade. Nada sobre a mineração de músicas criadas por humanos e protegidas por direitos autorais aparece em seus comunicados. 

TikTok

A plataforma de vídeos de origem chinesa não consegue esconder seu entusiasmo pela geração de música por inteligência artificial. Ano passado, o TikTok contratou vários especialistas "altamente qualificados" em aprendizado automático por máquinas e criação de música por IA, tanto na China como nos EUA. Esta semana, sua controladora, a ByteDance, publicou um anúncio buscando um gerente de projetos em Los Angeles (EUA) para "trabalhar em uma ferramenta com inteligência artificial que fornece recursos inteligentes de criação de música e edição de áudio.”

O projeto, segundo a ByteDance, quer "reduzir significativamente a barreira da criação musical e inspirar a criatividade e a expressão musical, enriquecendo ainda mais o conteúdo" dos vídeos. Traduzindo: com a expressão reduzir a barreira da criação, a empresa-mãe do TikTok quer dizer compor música sem compositores, em mais um passo na direção da sua conversão em um ecossistema musical 360, que domine todas as etapas de produção, distribuição e utilização de canções.

Believe

A Believe, uma das mais conhecidas empresas de distribuição digital e gestão de repertório, também toma seu lado na questão. E o faz com firmeza. Na semana passada, seu cofundador e diretor-executivo, Denis Ladegaillerie, afirmou em comunicado que trabalha para banir a inteligência artificial das suas plataformas, entre elas a distribuidora TuneCore: 

“Implementamos vários controles de qualidade em nossos negócios e pretendemos não distribuir nenhum conteúdo 100% criado por IA, seja por meio do Believe ou do TuneCore.”

Segundo Ladegaillerie, "a tecnologia já permite detectar uma faixa gerada por IA com 99,9% de precisão em comparação com outra gerada por um ser humano". Inclusive, segundo ele, é possível saber se canções protegidas por copyright foram varridas e tiveram micropedacinhos usados na construção da faixa "robótica". Com isso, a plataforma acredita que é possível perseguir criminalmente os infratores, além de conseguir que eles paguem direitos autorais aos criadores das canções originais mineiradas. 

"A inteligência artificial, se bem usada, é uma oportunidade para aumentar a criatividade humana. E também uma oportunidade para os artistas monetizarem com o uso que ela faz das suas obras", ele resumiu.

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