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A ideia visionária que deu origem a uma bem-sucedida casa de shows
Publicado em 23/06/2023

Como o Soberano, criado há um ano pelo compositor Sergio Saraceni, vem levando medalhões da MPB a subirem a serra do RJ

Por Eduardo Fradkin, do Rio

Fotos: divulgação/Soberano

João Bosco se apresenta no Soberano: espaço intimista e com infraestrutura caprichada

Se as paredes falassem, as de uma ex-loja de roupas e ex-concessionária de carros, instalada num shopping na Região Serrana do Rio de Janeiro, estariam cantarolando felizes. Após suportarem anos de tédio no comércio varejista, elas vêm dando guarida, desde maio de 2022, a shows de Adriana Calcanhotto, Zélia Duncan, João Bosco, Elba Ramalho, Leo Jaime, Leila Maria, Francis e Olivia Hime, Lenine, Joyce, João Donato, Edu Lobo, Marcos Valle, Dori e Danilo Caymmi, Ivan Lins, entre muitos outros. Os responsáveis por levar esse rol de celebridades à casa de espetáculos Soberano, no Shopping Estação Itaipava, são o compositor Sergio Saraceni e sua mulher, a cantora Raquel Saraceni.

O casal se mudou do Rio para Itaipava - um distrito da cidade de Petrópolis - em 2014. Após quatro décadas fazendo trilhas sonoras para cinema e programas de TV, Sergio se aposentou, mas não ficou muito tempo parado. Sentia falta, na sua nova vizinhança, de uma casa de shows de médio porte, onde pudesse ver apresentações de jazz e MPB. Em outubro de 2021, quando foi de carro buscar a mulher numa loja, avistou o imóvel de aproximadamente 300 metros quadrados que se tornaria o Soberano. Foi um exercício de imaginação vislumbrar uma casa de shows naquelas ruínas.

"A loja estava abandonada há pelo menos dez anos. Estava com condomínio e IPTU atrasados, a maior encrenca. Mas eu resolvi encarar. A localização era boa, e não havia vigas que atrapalhassem a visão entre o lugar que imaginei para o palco e a plateia. Cheguei em casa e falei com a Raquel, que imediatamente comprou a ideia. Então, começamos a resolver os problemas legais do imóvel e assinamos um contrato de aluguel de cinco anos. Em fevereiro de 2022, começamos uma grande reforma. No dia 5 de maio (daquele ano), inauguramos o espaço com três espetáculos da Adriana Calcanhotto", conta Sergio, que ainda busca patrocínios para ajudar na manutenção da casa.

Valendo-se de amizades feitas na indústria do entretenimento, ele logo abarrotou a programação de nomes famosos. A atração de inauguração, porém, foi mérito de sua irmã, Denise Saraceni, ex-diretora de núcleo na Rede Globo.

"A Adriana é muito amiga da minha irmã. Foi um voto de confiança ela ter se disposto a fazer esses shows de inauguração do Soberano, sem nunca ter visto a casa", admite Sergio, que, naquela fase inicial, também contou com a ajuda do programador João Lins, filho (e empresário) de seu amigo Ivan Lins.

Público na sala principal

O próprio Ivan não demorou a aparecer por lá e até virou frequentador. Além de ter subido ao palco para um show, ele foi assistir aos de Dori Caymmi, Lenine e João Bosco.

"Fiz um show intimista que funcionou muito bem, um duo com o pianista Marco Brito. Os espectadores estavam próximos e puderam pedir músicas à vontade. Como o Marquinho (Brito) já trabalha comigo há 30 anos e conhece meu repertório de trás para frente, a gente conseguiu atender aos pedidos", conta Ivan, que voltará ao local para mais uma apresentação (possivelmente com um quarteto) em novembro. "A casa é linda, tem um design espetacular e uma acústica fantástica. O equipamento é de primeiro mundo, e os operadores são ótimos também. É uma casa perfeita para a música ao vivo. Tem um som de disco, de CD."

O ar intimista que cativou Ivan se traduz num ambiente com pista e mezanino para 100 espectadores sentados. Nas mesas, é servido jantar, a cargo da chef Manoela Rabin, que já comandou um restaurante em Itaipava chamado Maison Cocotte. Quando Edu Lobo foi tocar no Soberano, derreteu-se pela paleta de cordeiro... que passou a figurar no cardápio com seu nome. 

Uma área externa coberta, batizada de Espaço Ruy Castro (inaugurada pelo próprio escritor com uma palestra), comporta 60 pessoas e é isolada com uma vidraça e cortinas. Num recente festival de jazz e blues, com amplificação de som turbinada, a divisória foi abolida, e quem estava ali pôde curtir os shows. Mas, normalmente, eles são voltados apenas para quem está no salão interno. Peças de teatro, como "A Alma Imoral" e "O Pior de Mim", também já passaram por ali, e a próxima será "Charles Aznavour – Um Romance Inventado", em julho.

Apesar de acolher o teatro, a vocação principal do Soberano é mesmo a música, e um de seus trunfos é um piano de cauda, inaugurado por Francis Hime, não sem algum esforço.

"Na segunda metade do show, o pedal de sustentação do piano quebrou. Francis levou na esportiva e continuou o show, mas foi um desafio, porque ele usa muito o pedal de sustentação", lembra Sergio.

Os idealizadores do projeto, Raquel e Sergio Saraceni

Assim como Francis, que tem uma parceria musical com Olivia Hime, Sergio e Raquel já trabalharam juntos como músicos. Ele produziu o primeiro disco dela, "O Tempo Me Guardou Você". A faixa-título é de Ivan Lins, que também participou da gravação. Antes de se tornar sócia de Sergio no Soberano, Raquel trabalhou como guia de turismo na França. Os dois se conheceram há mais de 40 anos e chegaram a ter um namorico na época, mas foi há 11 anos que se reencontraram e não se separaram mais. 

Uma grande (e não tão óbvia) atração musical do Soberano é o próprio Sergio, munido de uma coleção de histórias que rendem bons papos. Ele assinou sua primeira trilha sonora em 1977, quando tinha 25 anos, para o filme "Anchieta, José do Brasil", dirigido pelo seu tio, o cineasta Paulo César Saraceni. Depois vieram três longas de Nelson Pereira dos Santos, "Nunca Fomos Felizes", de Murilo Salles, "Os Trapalhões e o Rei do Futebol", de Carlos Manga, "O Rei do Rio", de Fábio Barreto, e "Policarpo Quaresma - Herói do Brasil", de Paulo Thiago, entre outros. Na TV, contam-se "Roque Santeiro", "O Tempo e o Vento", "A Muralha", "Dalva e Herivelto: Uma Canção de Amor" e "O Cravo e a Rosa".

Na Globo, trabalhou com amigos como Dori Caymmi, que celebrará 80 anos tocando no Soberano, no dia 26 de agosto. A amizade com Dori se iniciara muitos anos antes, na casa de Tom Jobim. O "maestro soberano", como Chico Buarque o apelidou, compôs para o tio de Sergio a trilha do filme "A Casa Assassinada", e Dori cuidou dos arranjos. Não é preciso um Sherlock Holmes para desvendar a referência no nome da casa de shows regida por Sergio. 

 

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