Chegada ao país do grêmio do setor, GMS, é bem recebida pelo mercado, que destaca papel dessa função como ponte entre audiovisual e música
Por Alessandro Soler
A função de supervisor musical, fundamental para a seleção e a correta utilização de música em filmes, séries, games e publicidade, acaba de ganhar uma injeção e tanto no Brasil. A abertura de uma filial nacional do grêmio, ou guilda, dos supervisores musicais GMS, instituição surgida em 2010 nos Estados Unidos, representará um passo efetivo para a definitiva profissionalização dessa carreira.
O anúncio da abertura da GMS Brasil foi feito há uns dias, durante o encontro profissional Music Trends, no Rio de Janeiro. Na ocasião, Patrícia Portaro, copresidente da guilda ao lado de Mário Di Poi — ambos supervisores musicais com experiência de décadas em trilhas de dezenas de produções audiovisuais —, falou sobre o foco que terá a instituição:
“A GMS Brasil tem como objetivo principal a educação da indústria e a formação de profissionais da área de supervisão musical e sincronização (de canções em produtos audiovisuais). Não somos um sindicato, mas sim uma entidade educativa para os setores musical, audiovisual, publicitário e de games.”
Conhecedor das dinâmicas da produção audiovisual — como as necessárias sensibilidade e agilidade na escolha da canção ideal para cada produto — e também das leis de direitos autorais e regras de licenciamento e sincronização, o supervisor é uma ponte, um facilitador. Mas, mesmo dentro do mercado, há muita gente que sequer sabe que ele existe. Além de promover conscientização e capacitação (através de cursos e treinamentos), a GMS poderá ajudar a criar normatização nas relações entre quem faz e quem usa música.
A novidade, portanto, não só atraiu o apoio imediato de diversos players — a UBC entre eles —, mas provocou reações positivas unânimes de pessoas integrantes do mercado. Confira o que disseram ao nosso site importantes profissionais dos dois lados do “balcão” — os que negociam músicas e os que as utilizam —, além, claro, de quem atua como supervisor:
Juliana Medeiros, supervisora musical na TV Globo
“Quando entrei na indústria musical, aos 20 anos, eu não conhecia a supervisão musical. Mesmo que as trilhas de filmes e novelas me chamassem muito a atenção, essa atuação não aparecia no meu horizonte de carreira. Quando conheci de forma mais direta a área de Produção Musical da Globo, foi como se uma porta tivesse se aberto para o que seria o meu trabalho ideal, porque era algo que unia dois universos que eram grandes paixões.
A supervisão musical é isso, um elo entre o audiovisual e a música. O supervisor é aquele que tem bagagem não só artística, mas também técnica para fazer acontecer a visão do diretor. Atuando nessa posição, eu percebo que consigo ser um ponto de apoio para a produção, desde a construção de um orçamento até a finalização, passando pela conceituação — com base nas regras de direitos autorais, fonográficos, a dinâmica do mercado musical, observação de tendências e a própria rede de conexões com players dessa indústria, que poderão atuar como parceiros e facilitadores.
Vejo de forma extremamente positiva a iniciativa da GMS como uma maneira de dar mais visibilidade a essa função. Traz uma oportunidade de troca muito rica entre pares, compartilhamento de experiências e criação de redes de conexões, o que é extremamente valioso nessa área de atuação.”
Marcos Pompiano, gerente de sincronização da Sony Music Publishing
“Tudo o que houver de associação que equalize e organize o mercado traz benefício para todos, não só para a música, mas para o audiovisual. É fundamental ter um profissional alinhado com a pré-produção, encontrar a obra certa, a utilização correta, saber a importância da obra dentro de um conteúdo audiovisual, saber equilibrar… O mercado da música não é um supermercado, tem muitos detalhes. E um supervisor equaliza tudo isso. Alguns bons profissionais daqui já fazem parte da guilda nos EUA, outros atuam no exterior.
Com a atuação da guilda, vamos ter mais transparência e vamos perder menos tempo. Tivemos recentemente aqui (na Sony Publishing) o caso de uma obra de uma banda internacional gigantesca que, por não ter a figura do supervisor musical, não foi autorizada num filme. Ela foi usada numa performance do ator principal, mas o uso acabou recusado. Não se tratava de dinheiro, mas simplesmente de discordância sobre o teor da cena. O profissional que trabalha com isso, que é especializado nisso, entende as peculiaridades, as nuances das duas pontas, e consegue orientar o processo até a pós-produção com resultado bom para todos.”
Paula Barreto, produtora de cinema e audiovisual - Produções Cinematográficas L.C. Barreto
“Quando a gente inicia um projeto, o produtor, junto com o diretor, conversa sobre todas as referências visuais e musicais: quadros, outras obras de arte, músicas que lembram o clima do projeto... A música está presente desde o início da concepção. Ou seja, o supervisor faz parte da concepção da produção. A função, portanto, tem uma importância monstra, realmente estratégica.
A chegada da GMS é muito bem-vinda! Tudo o que ajude uma carreira a caminhar na direção da profissionalização facilita as relações de trabalho.”
Caroline Carneiro, gerente sênior de sincronização na BMG Brasil
“O supervisor musical é a ligação entre talentos ocultos e as oportunidades de sincronização na indústria da música, o que enriquece as produções audiovisuais com sua expertise. Então, a guilda vai ser uma instituição que congrega os líderes desse setor, e todos os amigos da entidade vão desempenhar papel crucial para estabelecer as conexões e fornecer os recursos que vão amplificar essas vozes.
Além disso, ela vai fortalecer a função, ao promover e disseminar a educação para os profissionais, o que semea conhecimento e enriquecer o trabalho desses profissionais tão talentosos e que, muitas vezes, não são tão reconhecidos no mercado.”
Leo Monteiro de Barros, produtor de cinema e TV, sócio da Conspiração Filmes
"A chegada da GMS ao Brasil é um passo há muito desejado e aguardado pelos produtores audiovisuais. A profissão do supervisor musical é uma das mais necessárias no momento atual da nossa indústria, ajudando os produtores e diretores a terem as melhores músicas possíveis nas nossas obras. Não é a toa que a palavra áudio é a primeira, no termo audiovisual: isso mostra a importância do som e da música nos filmes e séries."
Karen Coutinho, coordenadora de sincronização da Universal Music Publishing
“A vinda da guilda para o Brasil é de extrema importância, não só para quem atua como supervisor musical, mas também para toda a cadeia da música. A regulamentação da profissão também seria essencial para o enriquecimento das obras audiovisuais e para agregar o valor devido a autores e artistas de música que cada vez mais fazem da trilha um núcleo muito relevante nas produções locais."
Flavia Cesar, diretora estratégica, comercial e de sincronização da Warner Chappell
“A guilda está focada em trazer toda uma parte educacional. Não existe, no Brasil, nenhuma instituição formadora desses profissionais, que forneça material educacional para entender a figura do supervisor musical. Já faço esse trabalho há muito tempo de uma forma bem intuitiva. Há um tempo, meu chefe, Marcel Klemm, ofereceu a mim e à Nathália Macedo, minha coordenadora e responsável pela sincronização na Warner Chappell, um curso de supervisão musical no Berklee College of Music. Foi muito importante. Vai ser incrível para todo o mercado a chegada da profissionalização.
A gente, ao ser editora, trabalha na curadoria, só com catálogo nosso, então não faz toda a interface. Mas temos estado à frente de vários projetos, inclusive fazendo curadoria agora para um projeto grande da HBO Max. Já tínhamos feito o ‘Dom’, da Amazon Prime, todas as temporadas. Fizemos um reality show, e todas as músicas são da Warner Chappell… Nossa editora embarcou imediatamente quando conheceu a ideia do projeto. Ter a GMS por trás traz uma grande chancela para o trabalho de todos que atuam com isso no Brasil.”
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