Proposta original previa selo a bar que repassa valor aos músicos; agora, emenda garante também pagamento da execução pública aos autores
Por Fabrício Azevedo, de Brasília
Músicos tocam num quiosque na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Foto: Alexandre Rotenberg/Shutterstock
O couvert de músicos que tocam em bares, casas de shows e outros estabelecimentos é parte importante da subsistência deles, especialmente no início da carreira. Um projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados tenta estabelecer regras nacionais para sua cobrança e distribuição. De autoria da deputada Fernanda Melchiona (PSOL-RS), o PL 3441/2024, conhecido como Lei do Couvert, quer garantir que os valores cheguem realmente a quem é de direito, os intérpretes, instituindo um selo, “Bar Que Respeita o Músico”. Tal distinção, pelo texto original, seria concedida somente aos estabelecimentos que repassassem 100% do couvert aos artistas.
Mas recentemente foi incluída uma emenda, do deputado Julio Lopes (PP-RJ), que prevê que, para receber o selo, o bar também deverá estar em dia com o pagamento de direitos de execução pública aos compositores, via Ecad.
“Além da questão financeira, o couvert contribui para o desenvolvimento profissional e a visibilidade no mercado”, comentou a deputada Melchiona, que se inspirou numa lei municipal de Porto Alegre ao propor o projeto.
A transparência, ela disse, ajudaria aos clientes que apoiam músicos a selecionar locais que realmente promovam os artistas:
“Para garantir a aprovação dessa lei, é necessário a mobilização da classe e o apoio de instituições como a UBC e outras.”
Valorizando o trabalho intelectual
Já o deputado Julio Lopes (PP/RJ), presidente da Frente Parlamentar da Propriedade Intelectual e de Combate à Pirataria, afirmou que a emenda foi apresentada depois de uma sugestão do Ecad.
“Muitas vezes os direitos dos autores são negligenciados. Vincular o recebimento do selo ‘Bar Que Respeita o Músico’ ao estabelecimento estar em dia com os direitos autorais é uma maneira de valorizar esse trabalho intelectual”, afirmou Lopes, destacando a autoridade do Ecad para pedir a emenda, já que as sociedades que o compõem, somadas, representam os interesses de mais de 400 mil titulares de direitos autorais.
Atualmente, a Lei do Couvert tramita na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços (CICS). Depois, passará para várias outras comissões da Câmara dos Deputados, como a de Cultura (CCULT).
“A proposta não passará pelo plenário da Câmara, indo direto para apreciação pelo Senado. O caminho ainda é longo, mas acreditamos que a tramitação pode ser rápida”, avaliou Lopes.
Dando efetividade à lei
Consultor jurídico da UBC e presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Sydney Sanches observou que o couvert e os direitos autorais são pagamentos separados, mas não dissociados.
“Dar publicidade pelo uso do selo servirá também para valorizar os direitos autorais”, resumiu, ressaltando que o PL 3441 não altera a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998), mas aumenta a efetividade de seu cumprimento. “Atende à cadeia da música, gerando um ambiente mais positivo para várias áreas como turismo, entretenimento etc.”
Músico, professor e compositor filiado à UBC, Gabriel Paes toca há 15 anos em bares de Brasília e vê com bons olhos a iniciativa.
“Hoje sou mais seletivo com os ‘gigs’ (apresentações). Mas já tive problemas em receber o couvert em várias ocasiões”, contou.
Para ele, leis que protejam os músicos são necessárias, pois muitos acabam aceitando pagamentos menores.
“Também é importante valorizar os direitos autorais, mas gostaria que a lei tivesse algum mecanismo para estimular que compositores locais fossem tocados. Na maioria das vezes, o repertório é de autores já consagrados”, opinou.
Sydney Sanches disse acreditar que essa ideia é boa, mas que talvez requeresse um PL só para si.
“O ideal seria uma legislação específica para compositores locais ou políticas estaduais e municipais”, concluiu.
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