Instagram Feed

ubcmusica

No

cias

Notícias

Álbum, um livro de histórias cantado
Publicado em 03/06/2019

Imagem da notícia

Em oposição ao quase imperativo single, formato disco ainda seduz muitos artistas em busca de um produto que permita desenvolver uma narrativa

Por Kamille Viola, do Rio

Foto de Breno Galtier

Protagonista absoluto da era dos streamings, o onipresente single levanta uma questão óbvia: por que lançar um álbum atualmente? Para muitos artistas, a resposta é simples: o formato de canções encadeadas permite a criação de uma narrativa, com um conceito por trás. Isso tem sido explorado nos últimos lançamentos de criadores como Adriana Calcanhotto, Gilberto Gil, Moska, Jards Macalé e Jorge Mautner, entre tantos outros que optaram por dar ao disco uma cara de livro de histórias. No exterior, há casos autoexplicativos como o da espanhola Rosalía, expoente da mistura de flamenco com trap e pop. As músicas do seu álbum de estreia numa grande gravadora (Sony), "El Mal Querer", foram deliberadamente batizadas como capítulos, de 1 a 11, para não deixar lugar a dúvidas sobre o que ela queria alcançar.

A cantora e compositora soteropolitana Larissa Luz (foto), que acaba de lançar seu terceiro álbum solo, “Trovão”, é adepta do formato. “Cursei Letras, a minha mãe é professora de Literatura... Sou muito desse mundo e gosto de poder contar uma narrativa. Às vezes, com duas, três músicas, você até faz isso. Mas, com mais faixas, consegue-se contar de uma forma mais detalhada, para que a pessoa se sinta dentro desse universo e entenda a história que se está apresentando”, analisa. “Assim, a gente consegue oferecer um espetáculo mais profundo, mais intenso e que envolva não simplesmente um momento, mas uma experiência inteira, com início, meio e fim. Eu gosto da viagem completa.”

Larissa começou a trabalhar no disco no ano passado, contando com a produção do conterrâneo Rafa Dias, do Àttøøxxá, que também é parceiro dela em todas as faixas. Deu uma pausa para se dedicar ao teatro no musical “Elza”, no qual é uma das protagonistas (e que segue em cartaz, no Rio de Janeiro). Mas desde o início já sabia o que queria fazer no trabalho: trazer uma abordagem da ancestralidade negra sob uma perspectiva contemporânea, futurista. Toques matriciais se unem à música eletrônica no que vem sendo chamado de macumba pop.

“Queria propor uma conexão com o ancestral para um público jovem, de uma forma cotidiana, simples. E queria tentar desconstruir e ver o artístico nisso tudo também, dentro das práticas e religiões de matriz africana, o que elas têm de arte dentro de si. Falar de intolerância e de racismo religioso de uma forma não tão dura, não tão pesada”, comenta. Luedji Luna, Lazzo Matumbi e Ellen Oléria participam do trabalho.

Jards Macalé, que em fevereiro deste ano lançou “Besta Fera”, seu primeiro disco de inéditas em 21 anos, é outro entusiasta do álbum como suporte narrativo. “Eu, particularmente, gosto muito. Gosto do formato, gosto do que condensa. Aliás, gosto muito de vinil, da capa grande, das músicas reunidas e organizadas por lado, por conceito. O álbum permite pensar a música de outra maneira”, defende.

Para ele, seu disco, mais que um livro, é um pouco como um filme. “Porque somos todos do cinema, do teatro, eu e os músicos viemos desses lugares também. Pensamos em começo, meio, final”, explica. “É um disco de beiras, de estar prestes a cair, de observar a vida e a morte. É sobre o que vivemos hoje também, nesse mundo ‘besta-ferístico’. Aliás, depois que saiu o ‘Besta Fera’, eu tenho lido as pessoas falando disso, usando o nome como referência. Um deputado chama o outro de besta-fera, as pessoas estão se acusando de besta-fera. A ‘Besta Fera’ subiu ao palco. É uma ideia que estava pairando. As bestas-feras estão dentro da gente, como eu digo. Tem gente soltando, e tem quem esteja aprendendo a domar as suas”, resume Jards.

LEIA MAIS: Jards Macalé: 'Besta Fera' à solta na estrada

Tulipa Ruiz foi mais uma que não duvidou sobre o formato na hora de pensar na entrega de suas próximas canções, prevista para o ano que vem, quando completa dez anos de carreira. “O meu processo eu gosto de pensar de uma maneira muito analógica e, depois, adaptar para o digital", afirma a paulistana, que já tem quatro álbuns de estúdio lançados. "Gosto de narrativa, então sempre vou pensar num disco com onze músicas. Mas gosto depois de picotar essas músicas, embaralhar, e elas podem fazer sentido como single. Quem é apaixonado por isso vai buscar em vinil. O artista, hoje, na verdade tem que estar presente em todos esses lugares”, crê.

LEIA MAIS: Single ou álbum? Eis a questão


 

 



Voltar