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Rodas de samba: ensaio para a retomada
Publicado em 19/10/2020

Sentimentos desencontrados entre músicos e produtores – necessidade de trabalhar e medo da proliferação da Covid-19 – convivem nesse tipo de evento, já liberado no Rio, mas cuja volta ainda é tímida

Por Fabiane Pereira, do Rio

Foto de Marluci Martins

Uma edição do Samba do Trabalhador antes da epidemia: comportamento do público causa apreensão

 

O decreto que impõe restrições a shows e outras atividades culturais presenciais no Estado do Rio termina nesta terça (20). Se não houver prorrogação, pode se dar a autorização para a retomada de uma série de eventos, a exemplo do que já ocorreu com as rodas de samba, liberadas há algumas semanas desde que cumprida uma série de cuidados para evitar a proliferação do coronavírus. Mesmo assim, o retorno é tímido, quando não inexistente. Os músicos vivem sentimentos desencontrados. Se o tempo prolongado da proibição tem feito muitos artistas passarem necessidades financeiras, a verdade é que ainda não existe uma vacina que assegure a segurança da população, e há medo entre eles.

O compositor Moacyr Luz, que comanda o Samba do Trabalhador, planeja para o feriado de Finados (2 de novembro) o retorno da sua tradicional roda de samba das segundas-feiras no Clube Renascença, Zona Norte da capital fluminense. “A gente está vivendo um momento único: a paralisação do mundo inteiro para deixar essa doença passar, como se fosse uma ventania. Mas ela não passa, o vento continua. Para mim, está muito difícil ficar sem trabalhar. Acho importante a liberação, mas a gente tem que se adaptar às circunstâncias, porque não vai ser a mesma coisa”, comenta.

As circunstâncias às quais ele se refere são a reorganização de mesas e cadeiras, respeitando o distanciamento mínimo de dois metros entre elas, a ocupação máxima de 50% da sua capacidade (exceto para um mesmo grupo de pessoas, autorizado a ocupar a mesa toda), o uso de máscara por todos durante todo o tempo. Com menos público e mais medidas de proteção, os ganhos de músicos e produtores serão evidentemente menores. Mas, avaliam todos, melhor isso que a ausência completa de renda. 

“Pessoalmente, estou um pouco apreensivo. Tomei todos os cuidados, fiquei cinco meses dentro de casa e, ainda hoje, saio apenas quando é extremamente necessário. Mas sou a favor da liberação porque, se tem medidas de segurança, regras, se os órgãos públicos estão autorizando e se, ao redor do mundo, as coisas estão reabrindo de forma progressiva, acho que a volta das rodas de samba também é válida. A gente precisa trabalhar”, diz Rodrigo Lampreia, produtor da Roda do Lampra, também na cidade do Rio. 

Para ele e outros, um grande desafio será conter o comportamento do público, garantir que se respeitem as regras e o distanciamento, além da permanência nas mesas. Gabriel Azevedo, vocalista da banda Casuarina, crê que produtores e artistas deverão investir tempo e esforços em conscientização das pessoas. “É uma situação bem complicada. Estamos ainda numa pandemia, muitas vidas foram perdidas, o sentimento é de consternação e, claro, de muita preocupação ainda. Ao mesmo tempo, a situação dos profissionais da cultura é muito ruim. A ajuda do governo demora a sair, realmente fomos os primeiros a parar e seremos os últimos a voltar.”

Ele lembra que rodas de samba, por definição, pressupõem aglomeração. “Mas nada impede a gente de tentar mudar, adaptar um pouco essa realidade. É o tal do novo normal: se é possível para outras áreas, temos que fazer ser possível para o universo das rodas de samba também.”

Neste sábado (24), o grupo dele fará uma transmissão ao vivo no Teatro Riachuelo, no Centro da capital do Rio, pela série De Palco Aberto. 

Se as rodas, eventos de bastante aglomeração, continuam a tatear uma fórmula de retomada, ainda mais incerta é a situação dos ensaios em quadras, muito maiores e com um público várias vezes superior. O celebrado carnavalesco das escolas de samba Mangueira (Grupo Especial) e Império Serrano (Grupo de Acesso) Leandro Vieira vê um longo e acidentado caminho de retomada à “normalidade” principalmente pelo comportamento inadequado das pessoas. 

“Essa história de liberação com restrições de segurança para conter o aumento do contágio é a mais nova balela inventada pelo poder público. Nem os governantes do Rio nem a população carioca sabem o que é o respeito a algum tipo de ordem. O carioca é governado pela mesma desordem que critica, com o agravante de não querer deixar de fazer parte dela”, sentencia.


 

 



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