Autoramas, Planet Hemp, Pitty, Chico Science, BaianaSystem e Fernanda Takai são alguns dos lançamentos recentes no formato
Por Kamille Viola, do Rio
Depois dos discos de vinil, quem ataca outra vez são as fitas cassete. Sucesso nos anos 1970 e 1980 — sobretudo depois da invenção do walkman, em 1979 —, as fitas voltaram a ser produzidas, impulsionando um mercado até outro dia inexistente. Quando surgiram, em 1963, revolucionaram a indústria musical, graças às fitas virgens, onde era possível gravar som de forma simples. Até os anos 1990, eram uma das principais armas das bandas independentes, que podiam registrar seus trabalhos para vender ao público e mostrar a pessoas-chave do ramo. Em plena era do streaming, são uma alternativa para aqueles que não se contentam em ouvir a música sem poder guardá-la. Remodeladas, feitas com material de mais qualidade e em suporte mais atraente, colorido, vêm conquistando adeptos também, é claro, pela boa dose de nostalgia que evocam.
Fundada como uma fábrica de vinil, a Polysom desde o ano passado aposta no formato e vem relançando álbuns famosos. Os primeiros foram “Usuário”, do Planet Hemp, “No Recreio, Vol. 1”, de Nando Reis e “(Des)Concerto ao vivo, de Pitty, além de “Tranquility Base Hotel & Casino”, dos britânicos Arctic Monkeys — este último, um lançamento novo e concomitante aos outros formatos. Outros trabalhos ganharam novas versões em fitas, como “Da Lama ao Caos”, de Chico Science & Nação Zumbi, “Admirável Chip Novo”, também de Pitty, e “Duas Cidades”, do BaianaSystem, além dos que já nasceram disponíveis em cassete, como “O Tom da Takai”, de Fernanda Takai (de 2018), “Planeta Fome”, de Elza Soares, e “Matriz”, de Pitty, ambos de 2019.
Luciano Barreira, gerente-geral da Polysom, comenta que uma conjunção de fatores levou a empresa a apostar nas fitinhas, a partir do momento em que alguns equipamentos de duplicação ficaram disponíveis. “Quando conhecemos o engenheiro Milton Lange, fã declarado do formato e profundo conhecedor das máquinas de cassete, resolvemos aproveitar a experiência bem-sucedida do vinil e ir em frente com aquela nova oportunidade para reativar mais um formato físico que se perdeu com o tempo. Estamos bastante felizes com os resultados, embora ainda longe do que se espera economicamente falando”, diz.
Vocalista e guitarrista do grupo Autoramas, Gabriel Thomaz é entusiasta do formato e lançou um livro em que conta a história da cena rock dos anos 90 tendo como fio condutor as fitas-demo lançadas pelas bandas na época. “Magnéticos 90”, de 2016, é uma história em quadrinhos desenhada por Daniel Juca.
“Eu, particularmente, gosto da fita e do vinil. Simplesmente fui acumulando os formatos: vinil, cassete, CD... Tenho coleção inclusive dos cartõezinhos de download de dez, quinze anos atrás. Aqueles que você dava uma raspadinha e havia um código que permitia baixar a música. Vinham com uma arte muito bonitinha, havia inclusive empresas especializadas nisso. Quando isso virar raridade, nossa, aí vou ficar rico, porque eu ganhei vários, tenho de todos os países (risos)”, comenta Gabriel.
Os trabalhos mais recentes da banda, “O Futuro dos Autoramas” (2016) e “Libido” (2018), saíram em fita. Gabriel conta que a demanda surgiu do próprio público do grupo, principalmente nas turnês no exterior. “Quando começou essa onda, nos shows do Autoramas lá fora vinham várias pessoas perguntar: ‘Tem cassete de vocês?’. E eu falava: ‘Hã? Como assim?’. E sempre tinha alguma banda americana do lado que tinha o cassete, aí o cara deixava de comprar o nosso para comprar o da banda americana que tinha. Então tem que ter. Tem gosto para tudo mundo, a gente tem que estar aberto para as possibilidades e para as oportunidades de negócio”, defende. “Não é por causa de qualidade. É porque é bonitinho. E prova uma coisa: que ainda é muito legal colecionar música, completar discografia, ter a capinha, ter um formato, ter em casa. Além disso, você não está sendo escravo das ordens do momento. É a total contramão”, diverte-se.
Luciano Barreira crê que o mercado consumidor de cassetes tem um grande potencial de ampliação. “Acreditamos que possa ocorrer o mesmo que impulsionou o vinil, quando deixou de ser fetiche de colecionador para ser consumido por várias classes e idades como uma alternativa de se ouvir música de qualidade. Não se espera, obviamente, que o cassete atinja os mesmos níveis do vinil nos dias de hoje, mas há muito para crescer ainda.”