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Novo afrofuturismo é destaque de festival em São Paulo
Publicado em 18/11/2019

Miniedição do megaevento americano Afropunk, que virá completo a Salvador em 2020, marca o Dia da Consciência Negra com shows de BaianaSystem, Rincon Sapiência, Karol Conka, Aya Bass (foto) e outros artistas que fusionam ancestralidade negra e tecnologias

Por Gilberto Porcidonio, do Rio

Considerado, hoje, a principal celebração da cultura, da estética e da música negra contemporânea no mundo, o festival americano Afropunk fará sua primeira edição no país que tem a maior população negra fora da África, o Brasil. Surgido no bairro nova-iorquino do Brooklyn em 2005, o evento chega a Salvador com carga total ano que vem. Mas já entre amanhã (19) e quarta-feira (20), Dia da Consciência Negra, o Afropunk terá uma espécie de miniedição em São Paulo, o Black to The Future, dentro da  Feira Preta, que comemora seus 18 anos. 

Entre as atrações musicais, destacam-se artistas como BaianaSystem, Rincon Sapiência, Karol Conka, MikeQ, Aisha Mbikila, a crew Batekoo e o projeto Aya Bass — legítimos representantes de um movimento de mais de 50 anos de existência que mistura ancestralidade secular e elementos tecnológicos, uma onda que volta a ganhar força: o afrofuturismo.

Nas artes plásticas, na literatura, nos quadrinhos, no cinema ou na música, o diálogo entre tradições de tempos imemoriais e alta tecnologia deu ao negro, muitas vezes coadjuvante nas vanguardas artísticas ocidentais, um papel protagonista. Ícones como o jazzista e filósofo Herman Poole Blount, o Sun Ra, ajudaram a definir o afrofuturismo ao propor, entre outras questões, uma leitura do Egito como uma civilização negra e capaz de criar tecnologias que viajaram no tempo, impactando profundamente, e até hoje, toda a civilização humana. As ideias de Sun Ra calaram fundo em círculos acadêmicos e outros bem pop — a turma da axé music, principalmente por meio do Olodum, adotou parte do vernáculo egípcio e, claro, também o som e a estética da África subsaariana.

“Talvez, de todos do Brasil, (a Bahia) seja o lugar mais afrofuturista pois consegue se manter e atualizar constantemente de uma maneira legítima e muito forte, poderosa.”

Xenia França

Também na Bahia, o projeto Aya Bass, surgido durante o carnaval deste ano e formado pelas cantoras Larissa Luz, Xenia França e Luedij Luna, é um grande reivindicador do afrofuturismo. A base musical do bloco se calca não só sobre a obra dessas três cantoras negras baianas, como também de outras brasileiras que despontaram naquele estado entre os anos 1990 e 2000. Para Xenia, a força propulsora do afrofuturismo brasileiro, presente no Aya Bass e nos artistas do Afropunk em geral, é algo característico do povo baiano — e Carlinhos Brown, ela prega, é o artista que melhor simboliza esse movimento aqui no Brasil.

“Lembro de, no carnaval, sempre esperar para ver o que ele traria. Além da propulsão musical que ele promoveu com a Timbalada nas comunidades, é tudo uma seta que só aponta para frente e vem de uma cultura que se faz revolucionária a todo momento. É uma coisa que não combina com mesmice. Ela sempre se desdobra em coisas fantásticas e potentes. O nosso jeito de corpo é diferente, o gingado... As palavras são ligadas aos dialetos e linguagens iorubás, (há) a comida, os ritos religiosos como os banhos de folha… Talvez, de todos do Brasil, (a Bahia) seja o lugar mais afrofuturista pois consegue se manter e atualizar constantemente de uma maneira legítima e muito forte, poderosa.” 

"Essa memória ancestral, que ficou guardada como em uma cadeia de DNA, me traz uma emoção de algo que eu conheço bastante, mesmo sem nunca ter escutado antes."

Jonathan Ferr

Larissa Luz, que, antes do grupo, já tinha em mente um projeto para juntar cantoras negras com os arquétipos das orixás femininas, foi arrebatada pela estética afrofuturista quando conheceu o trabalho de Erykah Badu e se encantou com a produção de Janelle Monae. Desde então, mergulhou fundo nesse universo:

“Acredito nesses movimentos como uma releitura de tudo o que a cultura africana vem provocando no mundo com a diáspora. No Aya, a ideia é misturar o afrofuturismo com a cultura bass, para que a gente possa fazer uma leitura futurista de tudo o que tem de ancestral. É uma coisa que eu busco trazer ao meu trabalho. Foca no feminino e na convergência das nossas personalidades”.

Para o pianista carioca Jonathan Ferr, que toca desde os 9 anos e teve um primeiro contato com o afrofuturismo ao ver um clipe do americano Flying Lotus em 2013, a música negra em geral tem um caráter agregador.

Jonathan Ferr

“Essa memória ancestral, que ficou guardada como em uma cadeia de DNA, me traz uma emoção de algo que eu conheço bastante e que está comigo, é meu, mesmo sem nunca ter escutado antes. Acho que essa sensação de pertencimento quando se ouve música negra é muito forte, remete a uma memória ancestral afetiva que está no inconsciente coletivo, e isso passa por vários lugares. São muitas energias postas no processo de tudo o que você sofre. Não que uma pessoa branca não vá gostar, mas, com certeza, os negros, quando ouvem, sentem uma coisa especial”, ele diz.

Informações sobre preços e a programação completa da Feira Preta com o festival Black To The Future/Afropunk podem ser obtidas na página oficial do evento

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