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França taxará streaming a partir de 2024 para financiar indústria musical local
Publicado em 20/12/2023

Grandes plataformas se unem nas críticas à medida, e Spotify anuncia retaliações: retirará seu patrocínio a festivais de música franceses

Por Alessandro Soler, de Madri

É oficial. O governo francês publicou nesta terça (19) as normas sobre uma nova taxação das plataformas de streaming prevista no orçamento de 2024, a ser destinada ao financiamento de projetos musicais no país — e que vem provocando uma forte grita de gigantes como Spotify e Apple Music. Chamada de “imposto streaming”, a taxação foi aprovada em forma de lei pelo Congresso do país e poderá trazer até € 15 milhões já no ano que vem para os cofres públicos.

O governo do presidente Emmanuel Macron promete que usará esse dinheiro integralmente em editais de financiamento de festivais, gravações de discos por novos artistas, eventos musicais e outras formas de incentivo a talentos emergentes. Tudo realizado através do Centro Nacional da Música (CNM), um órgão surgido em 2020 para fomentar o mercado musical francês.

Segundo a nova normativa, plataformas de streaming “pequenas”, com receitas anuais de até € 20 milhões, não estarão sujeitas à taxação. As plataformas que superarem esse volume de receitas pagarão 1,2% do seu total de negócios gerados na França (o que inclui assinaturas premium e publicidade) para financiar os projetos do CMN.

Normalmente antagonistas em tudo, as plataformas se uniram nas críticas ao projeto, chamado de “golpe à inovação” pelo Spotify, cujo diretor-geral para França, Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo, Antoine Monin, usou termos inusualmente duros ao comentá-lo.

“Este é um verdadeiro golpe para a inovação e para as perspectivas de crescimento da música gravada na França. É uma medida desigual, injusta e desproporcional. A França já não será uma prioridade para o Spotify”, afirmou, ignorando o fato de que, há vários anos, o streaming de vídeo já paga uma taxa similar para o cinema francês, o que analistas têm descrito unanimemente como um importante estímulo ao crescimento do mercado local.

Monin usou sua conta na rede social profissional LinkedIn, nesta quarta-feira (20), para anunciar que o Spotify retira imediatamente o patrocínio a alguns festivais franceses. E prometeu novas retaliações para o ano que vem:

"Após o anúncio da implementação de um imposto sobre o streaming de música na França, lamentamos anunciar que o Spotify França deixará de apoiar, seja financeiramente ou através de ativações, as Francofolies de la Rochelle e as Printemps de Bourges, a partir de 2024. Outros anúncios ocorrerão em 2024.”

No centro da bronca das plataformas está o fato de ser o estado que, a partir de agora, gerirá os recursos, tirando dos departamentos de marketing de Spotify, Deezer e outras o poder de decidir a quem financiarão através de patrocínios. Inclusive, numa manobra a poucos dias da aprovação da nova lei, as plataformas se uniram para dizer que pretendiam destinar € 14 milhões em 2024 (valor similar ao que gerará a taxação) para projetos musicais que elas escolhessem financiar. Como a lei passou, espera-se que agora esse dinheiro jamais chegue aos eventos musicais franceses.

“Evidentemente, as plataformas tinham o interesse em manter o caráter voluntário dos patrocínios. O que esta lei faz é obrigá-las a dividir um pouco dos seus lucros com a indústria (musical) da qual se beneficiam, com critérios mais sólidos, perenes e democráticos”, diz Virginia Dias Caron, brasileira especialista em gestão de direitos e fundadora da Tropica Music & Film, uma agência sediada em Paris e dedicada à gestão e ao desenvolvimento internacional de carreiras artísticas.

Ela tem visto reações sobretudo positivas do mercado à nova taxação:

“A maior parte da cadeia produtiva tem opinado que trará um impulso à criatividade através do financiamento de novos projetos pelo CMN, um órgão criado nos mesmos moldes do CNC, dedicado ao cinema. Já existe uma taxa paga pelas plataformas de streaming audiovisual para financiar o cinema, e a prática está normalizada. Ainda precisamos ver como reagirá o streaming de áudio e o que ocorrerá futuramente, já que a nova lei está atrelada ao orçamento de 2024 e, como tudo o que se refere às finanças, precisará ser revalidada periodicamente.”

Para Dias Caron, levar para o âmbito estatal a gestão de recursos que financiam políticas públicas é um tipo de posicionamento “que a França tem desde sempre”.

“Todo ator inserido nas indústrias culturais e criativas do país reconhece e aceita isso. A Deezer tem se queixado bastante da nova lei, mas não vi nada parecido com a reação tão extremada do Spotify”, diz a analista, lembrando que o projeto original previa taxações ainda mais altas.

A base do projeto foi um relatório do senador Julien Bargeton (Renaissance, centro-direita), entregue em abril. Ele recomendou um imposto de 1,75% sobre as receitas provenientes do streaming (assinaturas e publicidade). Depois de intenso debates entre os diferentes grupos parlamentares, a contribuição obrigatória foi reduzida a 1,5% e acabou ficando em 1,2%, com validade já a partir de 1º de janeiro.

Embora a decisão do Spotify de suspender os patrocínios a festivais tenha causado mal-estar, não se aproxima da reação da gigante sueca ao recente anúncio, no Uruguai, de uma lei que obriga as plataformas a pagarem direitos conexos, aqueles devidos a cantores e intérpretes. Depois de confirmada a aprovação da lei, o Spotify anunciou, há exatamente um mês, que se retirará completamente do país em fevereiro.

 

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