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'Pacotão da isenção' entra em fase decisiva na Câmara
Publicado em 06/06/2017

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Pressão leva Renata Abreu, dona de rádios inadimplentes com o Ecad e relatora do projeto que libera do pagamento de direitos autorais rádios, hotéis e órgãos públicos, a anunciar substitutivo ao parecer que ela já havia dado — e que era favorável às isenções

De Brasília e do Rio

A comissão especial que analisa de uma só vez o Projeto de Lei nº 3.968, de 1997, e os seus 44 apensos, ou seja, projetos de similar teor, todos fundidos no primeiro e que isentam do pagamento de direitos autorais diversos tipos de rádios, entidades filantrópicas, eventos beneficentes e religiosos, órgãos públicos e hotéis e motéis, entra numa fase decisiva na Câmara dos Deputados. Nesta quarta-feira (8), às 14h30, haverá uma nova reunião deliberativa, que deve se beneficiar do produtivo debate ocorrido na audiência pública do último dia 1° de junho. Na ocasião, representantes de entidades de gestão coletiva, como a UBC e o Ecad, apresentaram argumentos contra o chamado “pacotão da isenção”, que pode representar prejuízo anual de mais de R$ 430 milhões aos autores, segundo levantamento do Ecad.

Em mais de duas horas de reunião, expuseram suas ideias Manno Góes, integrante do Conselho Fiscal da UBC; Glória Braga, superintendente executiva do Ecad; a advogada Vanisa Santiago, representante do GAP- Grupo Parlamentar Pró-Música; Dalton Spencer Morato, diretor-executivo da Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR); e deputados como Sérgio Reis (PRB-SP), cantor e compositor, Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Renata Abreu (Pode-SP). Esta última, como o site da UBC mostrou no último dia 5 de abril, é devedora de quase R$ 25 milhões ao Ecad por conta da inadimplência de duas redes de rádio que operam no interior de São Paulo e das quais é sócia. Apesar disso, não se declarou impedida de assumir a relatoria do projeto e apresentou parecer favorável às isenções no último dia 21 de março.

Manno Góes: “temos que estar muito atentos”
Em sua fala, Manno Góes lamentou o que chama de mais um golpe contra um grupo já exposto a maus pagamentos e inadimplência, o dos compositores musicais. “A gente enfrenta a inadimplência de estados e municípios, a gente enfrenta inadimplência de Google, inadimplência da Vevo, de plataformas de streaming. A internet hoje já representa 75% do consumo de música, então nós temos que estar muito atentos às mudanças daquilo que nós já temos garantido”, alertou, lembrando que os autores vivem daquilo que produzem e que não é justo que o fruto do seu trabalho seja disponibilizado gratuitamente, beneficiando unicamente os usuários, ou seja, aqueles que exploram as obras musicais para obter lucro ou animar seus eventos, seus cultos ou sua programação.

Além disso, para Manno, a isenção de pagamento por parte dos hotéis não se traduziria, necessariamente, numa queda de preço das diárias, o que representaria, a um só tempo, prejuízos aos autores e maiores lucros aos donos dos estabelecimentos.

"A internet hoje já representa 75% do consumo de música, então nós temos que estar muito atentos às mudanças daquilo que nós já temos garantido"

Manno Goes, compositor e membro do conselho fiscal da UBC

Glória Braga foi na mesma linha e lembrou que os hotéis, que usam músicas em seu sistema de entretenimento como parte do pacote de serviços oferecido, já pagam taxas segundo sua ocupação e a região socioeconômica em que se inserem. Durante a audiência, ela voltou a dizer que o total de isenções proposto no “pacotão” supõe uma redução de 56,9% na arrecadação anual e cerca de 122 mil titulares de direitos autorais prejudicados.

“O Ecad e as associações estão à disposição dos usuários caso eles tenham alguma sugestão. No caso dos hotéis, nós já apresentamos para eles, ao longo dos últimos anos, várias sugestões que eles não aceitaram. Como eles sugerem que seja feita a cobrança? Nós podemos ouvir e verificar e testar esses critérios novos. O que nós não podemos aceitar é que haja uma mudança do conceito. (Se) utilizou música para sonorizar aposento de hotel, para sonorizar área comum, esse pagamento de direito autoral tem que acontecer. Os autores vivem disso”, afirmou Glória.

Governo apoia lobby dos hotéis
Recentemente, como publicamos aqui no site, o governo federal cedeu ao lobby da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH) e da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA) e resolveu encampar a ideia da isenção para hotéis e motéis, propondo uma modificação na Lei Geral do Turismo com a inclusão oficial dessa desoneração. O motivo, segundo nota do Ministério do Turismo, é “estimular a indústria e a economia”. A liberação do pagamento também é defendida por outro projeto de lei, o PLS 206/2012, da senadora Ana Amélia (PP-RS), de teor muito similar ao do “pacotão da isenção” e que já teve mais de 1,3 mil assinaturas contrárias num abaixo-assinado que reuniu cidadãos comuns e grandes nomes da nossa música, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Carlinhos Brown, Paulinho Moska, Sandra de Sá e muitos outros.

No caso do PL 3.968/97, o da Câmara, o parecer favorável definitivo de Renata Abreu significa que a proposta irá direto a plenário, sem a necessidade de passar por qualquer outra comissão. Numa eventual aprovação pelo plenário, o pacote irá a votação no Senado, onde, se também passar, volta à Câmara. Superadas as votações nas duas casas, irá a sanção presidencial.

Deputados pedem vista e mantêm debate vivo

Ocorre que três deputados — Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Otávio Leite (PSDB-RJ) e Herculano Passos (PSD-SP) — pediram vista, e o deputado Jean Wyllys requereu a convocação de audiências com representantes das associações de gestão coletiva, a UBC entre elas, para ouvir seus argumentos. Vale lembrar que uma audiência similar, marcada para julho do ano passado, foi suspensa sem motivo aparente por Renata Abreu, que veio a apresentar seu parecer, em março passado — portanto, oito meses depois — sem sequer remarcá-la.  

"O substitutivo da Renata Abreu (...) afeta o direito do autor e a cultura como um todo, afeta a produção cultural"

Jean Wyllys (Psol-RJ), deputado membro da Comissão de Cultura da Câmara

Pressionada pelos deputados que se mostraram contrários ao seu parecer, a deputada agora promete apresentar um substitutivo ao parecer, “depois de ouvir todas as sugestões que forem apresentadas pelos diversos setores envolvidos”, como declarou. Ela não estabeleceu uma data para a apresentação do seu substitutivo, mas a ratificação do seu parecer favorável é dada como certa. Em repetidas ocasiões anteriores, e também na audiência da semana passada, Abreu disse “não concordar” com os critérios de cobrança do Ecad, amparados na prerrogativa legal do escritório central para gerir a arrecadação de direitos autorais e cujos valores são estabelecidos coletivamente com as sociedades e tendo sempre em conta a capacidade financeira dos usuários. Ela citou críticas ao Ecad por parte de autores que não recebem pagamentos, ao que o deputado Sérgio Reis contestou com a informação de que, muitas vezes, é a inadimplência dos usuários que provoca a situação.

Além disso, a deputada demonstrou desconhecimento sobre o modelo de aferição do uso de músicas pelas rádios, uma vez que pediu a criação de “um software” para mapeá-las. Glória Braga respondeu que há anos o Ecad já dispõe de ferramentas semelhantes, incluindo o Ecad.Tec CIA, premiado por publicações especializadas em tecnologia.

Nas próximas semanas, novos embates devem se dar nos corredores da comissão especial — e, possivelmente, também em outras. Para o deputado Jean Wyllys, o autor musical não pode estar sujeito aos interesses comerciais de setores que exploram as músicas mas estão descontentes com o sistema de gestão coletiva de direitos autorais. “Cabe à Comissão de Cultura discutir isso”, provocou, sugerindo que outra esfera fora da comissão especial com relatoria da deputada também tome partido nesse necessário debate. “O substitutivo da Renata Abreu (...) afeta o direito do autor e a cultura como um todo, afeta a produção cultural. Se um autor não pode ganhar pela sua obra, pelo que produz, como é que ele vai compor? Como é que ele vai fazer? É a música que acaba sendo comprometida”, resumiu o deputado.


 

 



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