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O que fazem as plataformas para combater os fake streams?
Publicado em 29/05/2025

Perguntamos a cada uma como coíbe uma prática que envolve o uso de IA e de fazendas de plays para distorcer pagamentos

De São Paulo

Num contexto em que o streaming é responsável por quase 40% da arrecadação mundial de direitos autorais musicais, segundo o Relatório de Arrecadação Global da Cisac 2024, não são poucas as tentativas de burlar o sistema para se apoderar de um quinhão das receitas ilegalmente. As reproduções falsas, chamadas pela indústria pelos termos em inglês fake streams, estão entre as principais preocupações do mercado internacional. Diferentes são os métodos para conseguir fake streams, e um só é o objetivo: receber dinheiro que deveria ser destinado aos titulares das canções legitimamente executadas nas plataformas.

“É uma prática tão perversa quanto a pirataria”, resume Fabio Geovane, diretor de Operações da UBC, lembrando que, se o streaming contornou o problema da pirataria que castigava a indústria no início deste século, os fake streams se converteram numa ação orquestrada para fraudar o sistema — o que, em termos práticos, os equivalem à pirataria.

Geovane participou de um debate sobre o tema na quarta-feira (28), durante o Rio2C, maior evento sobre inovação e tecnologia da América Latina, que ocorre até domingo (1º) no Rio de Janeiro. No painel estiveram ainda Bruna Campos, especialista em direitos autorais musicais e representante da UBC em Mato Grosso do Sul; e Eduardo Rajo, diretor da Pro-Música Brasil, a associação da indústria fonográfica. A mediação foi da gerente de Comunicação e Marketing da UBC, Mila Ventura, sócia-fundadora do site Mundo da Música.

Algumas das práticas mais comuns vinculadas a essa fraude atualmente são:

  • Usar inteligência artificial para criar faixas genéricas (desde músicas completas a trilhas brancas como barulho de chuva, sons ambientes e música de “estados de humor”, para treinar ou dormir, por exemplo) e inseri-las na plataforma através de uma agregadora digital;
  • Usar guias de música, ou seja, gravações feitas por um compositor quando vai "vender" sua criação a um possível intérprete, e que são criminosamente desviadas para serem publicadas no streaming sem autorização dos seus criadores, como já mostramos na Revista UBC;
  • Usar fazendas de plays, alimentadas por robôs (ou bots), que dão plays automatizados às faixas a serem fraudadas;
  • Usar scripts, conjuntos de comandos para reproduzir as faixas uma infinidade de vezes a partir de um mesmo computador ou de um conjunto limitado de computadores;
  • Criar múltiplas contas falsas para reproduzir as faixas simultaneamente;
  • Pagar para inserir as faixas as serem bombadas em playlists criadas por usuários dentro das plataformas de streaming, que costumam proibir esse tipo de comércio em seus termos de uso. Muitas vezes, depois da inserção são usados bots e scripts para aumentar ainda mais as audições das faixas.

Como o pagamento dos royalties aos titulares é feito mediante listas de plays (ou execuções) enviadas pelas plataformas, os fake streams acabam distorcendo a realidade, fazendo com que os titulares dessas faixas falsamente estouradas fiquem com partes substanciais das distribuições.

"Eu já sinto a preocupação lá na frente do recebimento do compositor, do artista, do músico, da pessoa física, do ser humano... Porque é uma concorrência desleal com robôs que mandam essa receita para uma pessoa que está fazendo isso. Com o uso da inteligência artificial, uma pessoa consegue, em um dia, gerar 1.000 fonogramas, colocar isso tudo dentro das plataformas digitais e ser remunerado”, afirmou Bruna Campos durante o debate no Rio2C.

Grandes players da indústria, como editoras e gravadoras, há muito vêm pressionando as principais plataformas para que aumentem a fiscalização sobre a prática e implementem sistemas para coibi-la. Para saber como cada plataforma vem agindo, a UBC procurou as cinco maiores em operação no Brasil: Spotify, Amazon Music, Apple Music, YouTube Music e Deezer.

De todas elas, a única que nem sequer respondeu aos pedidos de informação da UBC foi a Apple Music. Já a Amazon afirmou, através de sua assessoria de imprensa, que “a empresa não comenta sobre os processos internos.” 

Saiba, então, quais são as políticas das três que responderam aos questionamentos da UBC: Spotify, Deezer e YouTube Music.

 

Spotify

“O Spotify investe fortemente em revisões automáticas e manuais para prevenir, detectar e mitigar o impacto do streaming artificial em nossa plataforma. Quando identificamos manipulação de streams, tomamos medidas que incluem a remoção da contagem de reproduções e a retenção de royalties. Isso nos permite proteger os pagamentos de royalties para artistas honestos e trabalhadores.

“Além disso, o Spotify cobra das gravadoras e distribuidoras por faixa quando é detectado streaming artificial flagrante em seus conteúdos. O objetivo é desincentivar essas empresas a continuarem distribuindo músicas de agentes mal-intencionados que tentam desviar dinheiro de artistas honestos e dedicados.

“Sabemos que os agentes mal-intencionados estão sempre evoluindo, por isso, nosso time dedicado à prevenção de fraudes está constantemente trabalhando para identificar novas tendências e métodos usados para burlar o sistema. Esse time tem anos de experiência estudando o comportamento de consumo e consegue, com o apoio da tecnologia do Spotify, diferenciar escuta genuína de streaming artificial.”

Deezer

“Em 2024, a Deezer removeu 9% dos streams por terem sido detectados como falsos. Contamos com uma equipe dedicada a esses temas, desenvolvendo algoritmos de aprendizado de máquina para detectar comportamentos fraudulentos. Trabalhamos nesses algoritmos desde 2013, e eles estão em constante evolução.

“Reforçamos a segurança dos nossos aplicativos para dificultar que fraudadores gerem streams falsos. Também colaboramos com os distribuidores de conteúdo, compartilhando dados e ajudando-os a identificar maus atores do lado deles.

“O principal problema é o conteúdo usado apenas para gerar streams falsos. Pode ser ruído branco, música simples criada a baixo custo, música roubada ou conteúdo gerado por IA, mas o objetivo é sempre o mesmo: abocanhar uma parte do fundo de royalties.”

YouTube Music

“O YouTube não permite nenhuma prática que aumente artificialmente o número de visualizações, marcações "Gostei", comentários ou outras métricas usando sistemas automáticos ou veiculando vídeos para espectadores que não os selecionaram. Além disso, é proibido postar conteúdo criado apenas para incentivar o engajamento dos espectadores (visualizações, marcações "Gostei", comentários etc.).

“Os conteúdos e canais que não seguem essa política podem ser encerrados e removidos do YouTube.

“Importante: se você contratar alguém para promover seu canal, ele poderá ser afetado pelas decisões dessa pessoa. Se você ou alguém que você contratou realizar uma ação que viole nossas políticas, seu canal ou conteúdo poderão ser removidos.

“Consideramos o engajamento legítimo quando a intenção principal de um usuário humano é interagir de maneira autêntica com o conteúdo. O engajamento ilegítimo é aquele que, por exemplo, é resultado de coerção/enganação ou que tem como único objetivo lucrar com o envolvimento dos espectadores.

“Se você encontrar conteúdo que viola esta política, faça uma denúncia. Acesse este link para ver instruções sobre como denunciar violações às diretrizes da comunidade.Se você quiser denunciar mais de um vídeo ou comentário, é possível denunciar o canal.

“Os números de inscritos exibidos nos seguintes locais são atualizados em tempo real:

  • A página inicial do canal
  • Seletor de contas
  • Página de exibição do vídeo
  • Sites e apps de terceiros que usam a API YouTube Data

“No YouTube Analytics, a contagem de inscritos pode ser diferente do que aparece no seu canal. A atualização desse valor na ferramenta pode demorar até 48 horas. Esse tempo é necessário para fazer verificações e análises de spam adicionais, garantindo a precisão dos números.

“O tráfego classificado como artificial não será contabilizado no YouTube e poderá resultar em advertências à sua conta. Contas encerradas e inscritos identificados como spam não serão contabilizados no total de inscrições ou visualizações. Como não são espectadores ativos, a remoção deles não afetará o tempo de exibição ou as visualizações do seu canal.

“Caso um vídeo seu tenha sido removido por manipulação da contagem de visualizações, consulte esta página da Central de Ajuda para mais informações.”

 

Para Fabio Geovane, as ações das plataformas são legítimas, mas não necessariamente efetivas.

“Como vimos nas respostas dos provedores de serviços digitais (DSPs), eles dizem estar tomando medidas para coibir a prática do fake stream, mas sabemos que não estão conseguindo combater ou evitar a grande maioria dessas fraudes. Por isso, acho que deveriam tomar medidas mais drásticas.”

Geovane elenca quais medidas poderiam ser essas:

1) Cobrar pelo upload de gravações, caso uma agregadora (ou qualquer outro parceiro) tente subir mais de x gravações;

2) Fazer um pente fino nas agregadoras e exigir mais responsabilidade em contrato;

3) Investir seriamente em sistema para detectar e barrar os fake streams.

4) Ajudar as autoridades a identificarem as fazendas de plays e, assim, conseguir dar informações para que essa prática seja punida.

 

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