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EUA voltarão a debater ‘salário mínimo’ no streaming, em novo projeto de lei
Publicado em 20/08/2025

Living Wage for Musicians foi originalmente apresentado ano passado, mas caiu da pauta; deputada e entidade se mobilizam para aprová-lo

Por Ricardo Silva, de São Paulo

A deputada federal norte-americana Rashida Tlaib vai reapresentar no fim de setembro o projeto de lei Living Wage for Musicians (ou algo como Salário Mínimo para Músicos), que pretende estabelecer os parâmetros básicos para remunerar os titulares de direitos no ambiente de streaming — sobretudo os músicos participantes das faixas, que atualmente não recebem royalties diretamente das plataformas. A iniciativa ganhou novo impulso com o engajamento ainda maior do sindicato United Musicians and Allied Workers (UMAW), que está mobilizando músicos e fãs para pressionar parlamentares a apoiarem o texto.

Apresentada inicialmente em março de 2024, em parceria com o deputado Jamaal Bowman, a proposição não avançou antes das eleições de novembro passado e acabou caindo da pauta do Congresso. Agora, a expectativa é de que a reintrodução marcada para 29 de setembro tenha mais fôlego, especialmente após a Câmara Municipal de Nova York ter aprovado, em maio, uma resolução em apoio à medida — gesto interpretado pelo UMAW como um sinal de crescimento da adesão política.

COMO FUNCIONARIA?

O plano prevê a criação de um Fundo de Compensação para Artistas, abastecido por duas fontes:

  • uma taxa adicional equivalente a 50% do valor da assinatura mensal dos serviços de música;
  • e uma cobrança de 10% sobre as receitas que não vêm de assinaturas, como publicidade.

Os recursos seriam repassados diretamente aos titulares — músicos, intérpretes, compositores — conforme sua participação nas faixas. Embora não esteja totalmente fechada, a ideia é que cada play naquela música renda pelo menos um centavo de dólar. O limite seria milhão de streams de uma mesma faixa por mês, o que renderia a um mesmo titular um salário mensal de até US$ 10 mil por faixa.

Em agosto do ano passado, quando o projeto foi lançado pela primeira vez, a deputada Tlaib, membro do partido Democrata e representante do estado de Michigan no Congresso Americano, justificou a iniciativa:

"O streaming mudou a indústria musical, mas está deixando inúmeros artistas com dificuldades para sobreviver”, disse. “Precisamos garantir uma renda mínima a quem cria as músicas que movem toda a indústria.”

Na época, a UMAW já havia se engajado, e seu representante, Damon Krukowski, falou à UBC:

“Há muita conversa na indústria sobre como ‘consertar’ o streaming – mas as plataformas de streaming e as grandes gravadoras já se manifestaram por mais de uma década e falharam com os músicos. O Living Wage for Musicians apresenta uma nova solução centrada no artista, para fazer o streaming funcionar para muitos e não apenas para alguns. Precisamos retornar valor às gravações, injetando mais dinheiro no sistema, e precisamos pagar artistas e músicos diretamente pelo seu trabalho.” 

Krukowski construiu uma carreira na indústria como baterista de bandas indie como Galaxie 500 e Damon & Naomi. A UBC pediu que ele citasse casos de artistas que não conseguem viver do que recebem do Spotify mesmo com "bons números" de plays. Ele deu a si mesmo como exemplo:

"Minhas bandas somam cerca de 750.000 streams por mês, mas isso não dá nem um salário mínimo".

RESISTÊNCIAS

Caso avance no Congresso, a proposta deve enfrentar forte resistência. Um exemplo: em um serviço que cobra US$ 11,99 pela assinatura premium, a taxa extra de 50% significaria um reajuste imediato de cerca de US$ 6 no preço final. As plataformas de streaming tendem a se opor a qualquer medida que eleve o custo ao consumidor.

As grandes gravadoras também dificilmente apoiarão o texto. Em mercados como o Reino Unido, elas já rechaçaram tentativas semelhantes de criar royalties diretos para artistas, defendendo, em vez disso, ajustes internos nas plataformas de música, como os chamados modelos “centrados no artista”.

Na França, a discussão tomou outro rumo. O governo decidiu impor uma taxa de 1,2% sobre o faturamento das plataformas de streaming, revertida ao financiamento da cultura. Embora esse dinheiro não vá diretamente para o bolso dos artistas, trata-se de uma resposta estatal ao descompasso entre crescimento do streaming e remuneração criativa — amplamente tida como aquém do que vale o trabalho dos criadores.

LEIA MAIS: França começa a colher os frutos da taxação ao streaming, na Revista UBC

No Brasil, onde o mercado de música digital já responde por mais de 80% da receita do setor, essa discussão ainda não chegou ao Congresso. O debate por aqui costuma girar em torno de mecanismos para melhorar os contratos entre artistas e gravadoras, que são as responsáveis por fazer os pagamentos dos royalties a eles.

O país, graças aos esforços do Ecad e das associações, é um dos que fazem a cobrança de execução pública das faixas tocadas no streaming. Os músicos participantes, porém, ainda não são igualmente beneficiados. As plataformas seguem sem pressões regulatórias significativas — embora haja discussões embrionárias sobre uma taxação semelhante à da França para financiar os músicos brasileiros —, e propostas de modelos alternativos de remuneração não entraram oficialmente na pauta política.

DEBATE JÁ É VITÓRIA

Independentemente da tramitação legislativa, a proposição coloca em pauta questões fundamentais: qual deveria ser o valor real de uma assinatura de música para garantir remuneração justa a quem cria as obras? O valor cobrado atualmente seria suficiente, caso outros atores do mercado (gravadoras, editoras) aceitassem dividir melhor os ganhos com os artistas?

Para o UMAW e para a deputada Tlaib, abrir essa discussão já é uma vitória. A resposta começará a ser desenhada no dia 29 de setembro, quando o texto voltará oficialmente ao Congresso dos Estados Unidos.

 

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