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Explosão da demanda leva a escassez de discos de vinil
Publicado em 13/04/2022

Gargalo na produção é desafio, mas fusões e megapedidos reforçam aposta da indústria pelo formato

Por Alessandro Soler, de São Paulo

O mercado musical enfrenta uma escassez de vinis. A mesma pandemia que arrasou o setor de shows levou a uma explosão na venda das bolachas na Europa, nos EUA e também no Brasil, colapsando as fábricas. Dados da IFPI, a federação internacional da indústria fonográfica, mostram que a capacidade de produção anual de LPs gira em torno de 160 milhões de cópias — mas a demanda global já ultrapassa 320 milhões. O megaincêndio que destruiu em fevereiro de 2020 a Apollo Masters, da Califórnia, uma das duas únicas fornecedoras de matrizes no mundo, e a disparada no preço do petróleo (matéria-prima dos LPs) decorrente da invasão da Rússia à Ucrânia não ajudam. Mesmo assim, a aposta pelo formato não tem volta, e prova disso é a recém-anunciada fusão de uma das maiores fabricantes com um dos maiores distribuidores de vinis do mundo, ambos sediados nos Países Baixos, dobrando sua capacidade de produção.

As receitas geradas com o formato crescem sem parar a cada ano: só em 2021, segundo a IFPI, o salto foi de 51,3% em relação a 2020, com coisa de US$ 3 bilhões gerados globalmente. Um terço desse valor veio de um único país, os Estados Unidos, onde a RIAA, a associação da indústria fonográfica local, revelou que o mercado de vinis cresceu 61% em um ano. Muitos artistas têm impulsionado pessoalmente o formato, basicamente por duas razões. A primeira é emocional: tácteis, bonitos e evocadores de memórias, os bolachões são parte da vida musical de muitos de nós e ganharam status de objeto de culto, razão pela qual os fãs estão dispostos a pagar valores relativamente altos por lançamentos impressos neles. A outra é financeira: com os ganhos do streaming ainda baixos, os royalties/direitos fonomecânicos são uma fonte extra de renda — e que, proporcionalmente, paga melhor.

Foi o que pensou Adele, a popstar inglesa, ao mandar prensar inicialmente 500 mil cópias do seu mais recente álbum, “30”, e apresentá-las concomitantemente ao lançamento no streaming, um gesto que impactou o mercado e causou ressonância entre outros artistas. As vendas foram tão bem que houve novas prensagens, e o total de cópias vendidas em 2021, segundo a IFPI, foi de 862 mil, número 1 em todo o mundo no formato e uma cifra notável mesmo para a era de ouro da indústria fonográfica, ainda nos anos 1990. 

De olho nesses ganhos cada vez mais polpudos, a Record Industry, com 33 prensas nos Países Baixos, anunciou no início desta semana a fusão com a também neerlandesa Bertus Distribution. A ideia da agora joint venture é aumentar nos próximos meses sua produção para 25 milhões de discos —praticamente o dobro da capacidade atual—, a serem usados por grandes gravadoras, selos alternativos e quem mais quiser contratar os seus serviços. O número é potente, mas ainda fica bem abaixo dos 38 milhões de vinis prensados em 2020 pela tcheca GZ Media, maior do setor em todo o mundo. 

“Com as novas prensas, não só seremos capazes de tentar melhorar o gargalo da entrega internacional de vinis, mas ainda permitir que mais artistas e bandas possam escolher o formato para os seus lançamentos”, disse Ton Vermeulen, presidente da Record Industry, em comunicado enviado ao site da UBC que também traz uma promessa do diretor-executivo da Bertus, Jan Van Dirtmarsch: “Queremos nos beneficiar da nossa expertise combinada a partir de uma fusão de nível inédito na Europa para buscar um crescimento suave mas contínuo na produção de LPs para os próximos anos.”

No Brasil, as duas fabricantes de vinis em atuação, a fluminense Polysom e a paulista Vinil Brasil, tiveram que dar um tempo na recepção de novos pedidos, ano passado, ante a avalanche de demanda. Em ambos os casos, tamanha disparada se deveu só mesmo ao mercado local, já que, pela incidência de altíssima tributação sobre importados, eles praticamente não trabalham com discos internacionais. Os pedidos, contaram seus diretores ao colunista Leonardo Rodrigues, do UOL, têm levado até um ano para serem entregues, contra os tradicionais prazos de 60 a 90 dias.

"O fenômeno é mundial. Quando acreditávamos que a pandemia iria acabar com o nosso negócio, ele simplesmente explodiu de tal forma que ninguém estava preparado. Mas a produção já estava muito acelerada já antes da Covid", comemorou o fundador da Polysom, João Augusto, ao portal. Já Michel Nath, dono da Vinil Brasil, admitiu ter tido que reduzir a produção a 50% da capacidade pelo impacto da pandemia. A expectativa, ele afirmou, era de uma normalização progressiva ao longo de 2022.

Ambos destacaram as dificuldades do setor no país, onde a crise econômica e a inflação corroeram fortemente o poder aquisitivo da população, permitindo a menos pessoas a compra de um lançamento em LP que facilmente ronda os R$ 150 ou mais. Por isso, no Brasil os discos de vinil ainda representam menos da metade das vendas dos CDs, segundo dados da ProMúsica Brasil. No seu mais recente relatório, a associação da indústria fonográfica nacional revelou que a comercialização de vinis gerou receitas de R$ 2,3 milhões no país em 2021, com alta de 28,1% em relação a 2020. Já os CDs (+56,5%, para R$ 7 milhões) e os DVDs (+337%, para R$ 2,8 milhões) tiveram melhores desempenhos. 

Nos EUA, é o contrário. Desde 2020, de acordo com a RIAA, os vinis ultrapassaram os CDs, respondendo por mais da metade das receitas com formatos físicos e alcançando 25 milhões de cópias vendidas. É de olho nessa oportunidade de lucro e posicionamento que muitos artistas têm adaptado suas estratégias de lançamento para incluir os LPs. A revista “Variety” contou que a finalização de “30”, de Adele, precisou ser antecipada, e o lançamento, adiado, para que houvesse uma janela mínima de seis meses para a impressão dos discos pela GZ Media em sua fábrica central na República Tcheca e em unidades da França, dos EUA e do Canadá.

Agora, segundo analistas internacionais, a indústria precisará correr atrás de soluções para diminuir a escassez de matrizes, os altos preços dos insumos e o gargalo nas linhas de produção se quiser manter o momentum tão favorável ao vinil. A Columbia Records UK já antecipou que lançará o quinto álbum de Adele também em LP — presumivelmente, numa tiragem ainda maior do que as 500 mil cópias iniciais do último. E tudo leva a crer que eles não estarão sozinhos nessa demanda.

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